Por que, na Rússia, as mulheres são maioria entre os juízes?

Apesar de reter 64,7% dos postos, juízas raramente atingem patamares mais elevados

Apesar de reter 64,7% dos postos, juízas raramente atingem patamares mais elevados

Artiom Geodakian/TASS
Número de juízas no país é 2,5 vezes maior que a média mundial, mas profissionais se sujeitam a um trabalho burocrático e remuneração modesta.

Todos os dias, a juíza de um dos Tribunais Distritais de Moscou, Elena Ivanova (cujo nome foi alterado a pedido da entrevistada), acorda às 6h30 para enfrentar os congestionamentos e chegar a tempo no trabalho. Ali passa a maior parte do dia: oficialmente, seu trabalho termina às 18hs, mas Elena costuma ficar até bem tarde, pois examina de 20 a 30 casos por semana.

Os cargos de secretário do tribunal e de assistente de juiz, a ela subordinados, também são ocupados por moças e que entre os juízes ela tem muitas colegas do sexo feminino.

Isso é confirmado pelas estatísticas: uma pesquisa realizada em 2014 pelo Instituto para o Estado de Direito (IPP, na sigla em russo), da Universidade Europeia de São Petersburgo, revelou que 64,7% dos juízes na Rússia são mulheres.

Este indicador é muito superior ao mundial: de acordo com a Associação Internacional de Advogados, o número médio de mulheres no sistema judiciário da maior parte dos países é de 25%.

Os autores da pesquisa do IPP destacam, porém, que também em outros países da Europa Oriental, que vivenciaram a experiência do socialismo, existe uma grande proporção de mulheres entre os funcionários do judiciário.

“Nos países socialistas o tribunal não era um instrumento-chave para a resolução de conflitos. Muitos casos eram resolvidos por meio de órgãos do partido”, explicou à Gazeta Russa o sociólogo Kirill Titaev, um dos autores da pesquisa. “Os homens jovens e ambiciosos preferiam atuar nas estruturas partidárias e no Ministério Público”.

Homens no topo

A juíza Elena Ivanova ganha cerca de 80 mil rublos (US$ 1.232) por mês e se diz satisfeita com sua remuneração atual, por estar de acordo com os padrões russos.

Seus colegas nos tribunais federais ganham 140 mil rublos (US$ 2.156), e o salário de um juiz do Supremo Tribunal, cargo onde há maior prevalência de homens, pode chegar a 300 mil rublos (US$ 4.620).

“São os homens que chegam primeiro aos patamares mais elevados e, nesse sentido, podemos falar de uma discriminação em relação às juízas”, disse Titaev. “Mas essa é uma tendência geral das sociedades ocidentais”.

Independentemente, o especialista acredita que os funcionários do Sistema Judiciário russo sejam mal remunerados. “O salário médio de um secretário é de 17 mil rublos (US$ 261), e isso é muito pouco. Na Europa, geralmente os pagamentos dos funcionários do judiciário estão bem acima da média.”

Discriminação velada

De acordo com estatísticas do IPP, são justamente os funcionários do sistema judiciário que mais frequentemente acabam se tornando juízes: após passarem de cinco a sete anos trabalhando nos tribunais, eles têm mais facilidade de passar em um exame de qualificação.

Na cultura de negócios russa, que é considerada bastante patriarcal, presume-se que as mulheres se ocupem com um trabalho rotineiro que não seja físico: quanto mais burocrática for uma função, maior a probabilidade de ela ser desempenhada por uma mulher.

De um modo geral, percebe-se que as mulheres predominam nos tribunais russos principalmente devido à relutância dos homens em esperar durante muito tempo por uma promoção e em se sujeitar a um trabalho pesado, rotineiro e mal remunerado.

Os próprios juízes em exercício confiam e protegem suas subordinadas. O presidente do tribunal, ao decidir a quem promover, costuma dar preferência às jovens que já comprovaram a eficiência de seu trabalho dentro do sistema judiciário.

“Ao longo de vários anos, os funcionários do judiciário recebem muito pouco por um trabalho pesado, a fim de garantir no futuro um salário alto no cargo de juiz e uma vida confortável na velhice”, observou Titaev.

Após 20 anos de serviço, um juiz na Rússia pode se aposentar e receber o equivalente ao salário médio atual de um juiz da mesma categoria.

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