Cresce tensão na Síria após quebra de cessar-fogo

Aleppo em ruínas após ataques aéreos perpetrados pelo governo sírio

Aleppo em ruínas após ataques aéreos perpetrados pelo governo sírio

AP
Acusações recíprocas entre Rússia e os Estados Unidos tornaram-se ainda mais ressonantes depois do fracasso do processo de paz na Síria. Segundo especialistas, crescente tensão mina a possibilidade de acordo entre Damasco e a oposição, além de ameaçar o restabelecimento das relações entre Moscou e os países ocidentais.

O cessar-fogo na Síria, que foi celebrado entre o ministro dos Negócios Estrangeiros russo, Serguêi Lavrov, e o secretário de Estado dos EUA, John Kerry, em 10 de setembro, falhou uma semana depois de entrar em vigor.

Após o incidente envolvendo as forças norte-americanas e as tropas do Exército sírio em Deir ez-Zor, em 17 de setembro, e o bombardeio de um comboio humanitário das Nações Unidas, em 19 de setembro, pelo qual a coalizão liderada pelos EUA acusa o governo sírio, a guerra recomeçou com ainda mais intensidade.

As forças do governo e as divisões da oposição continuam lutando por Aleppo, que permanece à beira de uma catástrofe humanitária. Enquanto isso, Moscou e Washington criticam fervorosamente uns aos outros, e ambos defendem que as ações dos lados opostos estariam levando à quebra do acordo de paz.

“Estamos prestes a suspender as discussões”, disse Kerry na quinta-feira passada (29), ao falar sobre as negociações com a Rússia em relação ao processo de paz na Síria.

Segundo o secretário norte-americano, as tentativas de resolução não fariam sentido diante dos novos combates em Aleppo e da falta de confiança entre as partes.

Mais cedo, o porta-voz do Departamento de Estado dos EUA, John Kirby, culpou a Rússia pela perpetuação da guerra civil síria, em decorrência do apoio de Moscou ao presidente sírio Bashar al-Assad.

Kirby também alertou para as “tristes consequências” da postura russa, incluindo o possível ataque a cidades russas e o “retorno das tropas em sacos para cadáveres”.

As declarações foram prontamente rebatidas pela pasta tanto dos Negócios Estrangeiros, como da Defesa.

O vice-chanceler russo Serguêi Riabkov se referiu às palavras de Kirby como “ameaças óbvias e cínicas”, enquanto o porta-voz do Ministério da Defesa, Ígor Konachenkov alegou que as declarações revelam que a oposição síria apoiada pelos EUA é, “na verdade, uma organização terrorista internacional”.

Beco sem saída

As retóricas da Rússia e dos EUA estão se tornando cada vez mais agressivas e levam o processo de paz a um beco sem saída, segundo o acadêmico árabe Grigóri Kosatch, que leciona na Universidade Estadual de Ciências Humanas, em Moscou.

“Tanto no lado russo como no ocidental, os ‘grupos de guerra’ se impondo. Eles não desejam conciliação nem planejam reiniciar o processo político na Síria”, argumenta Kosatch, acrescentando que as perspectivas das negociações de paz são “sombrias”.

Os representantes do  Alto Comitê de Negociações (ACN) da oposição síria também anunciaram recentemente que seria impossível reiniciar os contatos para negociações de paz, indicando que as milícias estariam dispostas a continuar lutando.

Segundo Kosatch, a liderança síria mantém a postura semelhante, e, diante das condições atuais, Assad detém o controle sobre as ações Moscou-Damasco.

“Em muitos aspectos, a Rússia só está seguindo o fluxo em suas relações com o regime sírio, o que denota uma posição extremamente desvantajosa”, acrescenta o estudioso árabe.

Esse posicionamento é também compartilhado pelo observador do jornal de negócios russo “Kommersant”, Maksim Iússin.

“Os defensores da linha dura em Damasco teimam em definir um objetivo inatingível – vencer a guerra”, disse Iússin à rádio Kommersant.

O especialista acredita que a situação chegou a um impasse: nem Assad nem a oposição tem recursos para vencer a guerra. “Não existem alternativas à resolução pacífica, mas, atualmente, os lados não estão prontos para isso”, arrematou.

Novas sanções

Ao falar sobre a “posição improdutiva da Rússia”, o porta-voz da Casa Branca, Josh Earnest, declarou na semana passada que os EUA e seus aliados poderão impor novas sanções adicionais em relação a Moscou.

A possibilidade de uma nova rodada de medidas proibitivas também foi levantada pelo ministro das Relações Exteriores britânico, Boris Johnson.

O porta-voz do Kremlin, Dmítri Peskov, defendeu, porém, que o reforço da política de sanções econômicas  não “levará a nada de bom” e “aprofunda a incompreensão” sobre o processo de regulação do conflito sírio.

“Eu acho que o Ocidente não vai introduzir novas sanções contra Moscou, mas a situação com as [medidas] já existentes está ficando pior”, avalia Serguêi Karaganov, decano da Faculdade de Política Global na Escola Superior de Economia.

Na opinião de Karaganov, os acordos anteriores entre Rússia e Ocidente abria caminhos para a colaboração também em outras esferas, incluindo uma possível suspensão das sanções. “Agora, no entanto, após o fracasso da regulação pacífica e o aumento recíproco da desconfiança, podemos esquecer essa possibilidade”, conclui.

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