Rússia e EUA competem por presença em Cuba

Segundo especialistas, Washington se reaproxima de vizinho na tentativa de coibir influência russa

Segundo especialistas, Washington se reaproxima de vizinho na tentativa de coibir influência russa

AP
As medidas tomadas para a restauração das relações diplomáticas entre Cuba e os EUA têm dado origem a inúmeros comentários. Muitos relatam que os beneficiários das medidas seriam os cidadãos de Cuba ou o regime liderado por Raúl Castro. No entanto, pouca atenção tem sido dada aos interesses geopolíticos dos EUA.

O interesse renovado dos EUA por Cuba acontece em um momento de crescente tensão com a Rússia e em meio ao renascimento da diplomacia entre a Rússia e a ilha caribenha – o que deixa Washington em uma posição geopolítica pouco interessante.

A Rússia está hoje preocupada com a expansão da Otan no Leste Europeu, que segue os interesses dos EUA na região e se intromete em uma área de influência russa.

Devido a seu envolvimento na Síria, porém, o Kremlin conferiu à Rússia um papel importante na mesa de negociações para solucionar o conflito, obrigando os EUA a desenvolver uma atitude geopolítica cautelosa em relação a Moscou.

Além disso, a Rússia tentou seguir os passos de China e promoveu acordos com vários países da América Latina. Desde 2008, Moscou tem tentado construir relações com Brasil, Cuba, Venezuela e Nicarágua, entre outros países da região, com o objetivo de estabelecer acordos geopolíticos e econômicos com vizinhos dos EUA.

Cabe lembrar que a parceria entre Cuba e a União Soviética serviu para manter a ilha à tona durante a maior parte do século 20. Após o colapso do regime soviético, o Kremlin parou de dar ajuda financeira a Cuba, o que deixou a ilha sem acesso a importações, capital e até mesmo alguns itens de necessidade básica.

Pútin impulsiona relações com Havana

O presidente russo tratou de restaurar as relações com Havana na esperança de estabelecer uma aliança com a ilha. Em 2008, a Rússia foi o primeiro país a socorrer Cuba após a passagem de três furacões que geraram consequências graves para o país.

No ano seguinte, Cuba assinou um acordo permitindo que a Rússia participasse da exploração de petróleo no Golfo do México.

Moscou também concordou em fornecer um empréstimo de 150 milhões de dólares para a compra de equipamentos usados nos setores de construção e agricultura.

Mais recentemente, em 2014, o Kremlin perdoou a maior parte da dívida cubana com Cuba, ou 32 bilhões de dólares, e, pouco antes de visita de Obama à ilha, a Rússia aceitou conceder um empréstimo de US$ 1,4 bilhões para modernizar duas usinas.

Além do apoio financeiro, existe também uma troca militar e cultural entre os países. A Rússia investe na construção de museus em Cuba, enquanto Havana comemora os ataques aéreos russos na Síria, estabelecendo, assim, uma espécie de “camaradagem” os países. Isso sem contar que ambos já sofreram sanções dos EUA.

Enquanto crescem as tensões entre Rússia e EUA, Rússia e Cuba se aproximam, e os EUA tomam medidas para evitar que o adversário ganhe influência em seu “quintal”.

O embargo dos EUA contra Cuba era mantida havia 50 anos, mas, desde 2014, Washington toma medidas para restabelecer as relações diplomáticas. Além disso, o governo americano não obrigou Cuba a fazer mudanças em seu modelo econômico e político ou interferiu em questões de direitos humanos. Segundo a Casa Branca, a postura diferente tem a ver com a esperança de que Cuba siga um caminho melhor.

O que está por trás da geopolítica dos EUA

Embora essa abordagem sirva para produzir manchetes positivas e angariar seguidores entre os cidadãos de Cuba e dos EUA, focar em altruísmo sem abordar os interesses geopolíticos de decisões diplomáticas limita a apreciação da estratégia geopolítica dos Estados Unidos.

A nova relação entre Cuba e Rússia, assim como a crescente tensão entre Rússia e EUA, poderia servir como um incentivo para Washington tente reestabelecer relações diplomáticas com o país caribenho sem se preocupar com as concessões de Havana.

Com o estabelecimento de relações diplomáticas com Cuba, os EUA evitam que a Rússia se torne um novo parceiro comercial no país caribenho e, assim, aumente sua influência local. A necessidade de Cuba de encontrar novos parceiros ficou evidente após a morte de Hugo Chávez em 2013. Enquanto a Rússia começava a preencher o vazio deixado pela Venezuela, os EUA agiram rápido para limitar a influência russa.

Em discursos e notas oficiais, o Kremlin aplaudiu a iniciativa tomada por Cuba e Estados Unidos de retornar à diplomacia. A maioria dos americanos acreditam que a retomada de laços é positiva, especialmente para a população cubana. No entanto, neste caso, o real beneficiário é justamente os EUA, que impedem a influência russa no país vizinho e a possível repetição de uma crise dos mísseis.

Assim, tanto a Rússia como os EUA disputam espaço em Cuba. Os americanos usam sua proximidade e alianças culturais para garantir vantagem, ou, pelo menos, uma forte presença nessa esfera geopolítica. Essa presença protegeria Washington de qualquer potencial ameaça da Rússia e justifica a decisão de restabelecer as relações com Cuba, mesmo com a ausência de concessões por parte da ilha.

Publicado originalmente pelo Russia Direct

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