Quem é Kisliak, o embaixador acusado de espionagem

Para observadores, caráter comunicativo de Kisliak misturou-se a acusações.

Para observadores, caráter comunicativo de Kisliak misturou-se a acusações.

AP
Bastou um contato entre o embaixador russo nos EUA, Serguêi Kisliak, e o conselheiro presidencial norte-americano para assuntos de defesa, Michael Flynn, para que este fosse demitido. Agora, outro aliado de Trump, o procurador-geral Jeff Sessions, sofre críticas após conversar com o russo. Segundo comentarista, diplomata tem histórico “sem máculas”, e sua situação é análoga à do ex-embaixador norte-americano em Moscou Michael McFaul.

Charmosa e provocadora, a porta-voz oficial do Ministério dos Negócios Estrangeiros, Maria Zakhárova, deixou em sua página do Facebook, na última sexta-feira (3), uma indireta à administração de Trump: “Estou entrando no Ministério. Vem da direção contrária o embaixador dos EUA em Moscou, John Tefft. Cumprimento o colega: ‘Você está correndo perigo ao falar com diplomatas russos... E se, de repente, a CNN descobre?’”

Foi assim que Zakhárova reagiu à reportagem do canal norte-americano que acusava abertamente o embaixador russo nos EUA, Serguêi Kisliak, de espionagem em território norte-americano – acusação que foi prontamente negada pela pasta.

Na reportagem, a porta-voz não contém os ânimos. “Parem de difundir mentiras e notícias do Facebook, esse é meu conselho de amiga à CNN”, diz Zakhárova ao repórter do canal enquanto esse a segue pelos corredores do ministério.

A irritação de Zakhárova é compreensível: nunca na história da Rússia moderna um embaixador do país havia sido acusado de espionagem.

Além disso, a CNN não é o primeiro canal norte-americano a acusar Kisliak de ser um agente.

Quem é Serguêi Kisliak?

A biografia de Kisliak não tem as "máculas” comuns das de funcionários dos órgãos secretos. Além disso, já não é a primeira vez que ele ocupa um cargo tão alto na diplomacia.

Entre 1998 e 2003, Kisliak foi embaixador da Rússia na Bélgica e, ao mesmo tempo, representante permanente da Federação da Rússia na Otan. De 2003 a 2008, exerceu o cargo de vice-chefe da pasta de Negócios Estrangeiros da Rússia, supervisionando assuntos americanos.

O jornal inglês The Daily Telegraph, ao discorrer sobre o diplomata, escreve que Kisliak “não é figura que cause controvérsia”.

Apesar disso, as relações com Kisliak já levaram à queda do conselheiro de Trump para assuntos de defesa nacional, Michael Flynn. O oficial teve que se aposentar após o grande escândalo gerado por ter escondido um encontro com Kisliak e o conteúdo dessa conversa com o russo.

“Se ele realmente quisesse levar ao embaixador da Rússia uma informação que, se não secreta, confidencial, ele não estaria lhe telefonando abertamente, sabendo que as ligações dos funcionários da embaixada são grampeadas”, disse à Gazeta.Ru um ex-diplomata russo que trabalhou em Washington e não quis ser identificado.

Relações em Washington

Na última sexta-feira (3), o jornal The New York Times publicou um artigo sobre Kisliak que mais reconhecia sua capacidade de relacionamento do que o acusava de espionagem.

De acordo com o veículo, Kisliak se encontrou não só com Flynn e Sessions, mas com o genro de Trump, Jared Kushner, na Trump Tower, em Nova York, em dezembro de 2016.

Agora, a oposição norte-americana exige a deposição do procurador-geral dos EUA, Jeff Sessions. Segundo o Washington Post, Sessions encontrou-se pessoalmente com o embaixador russo pelo menos duas vezes.

Em 2 de março, Sessions explicou que encontrou-se com o russo, mas apenas para trocar ideias. “Falamos um pouco sobre o problema do terrorismo, pelo que me lembro, e de repente veio o assunto da Ucrânia, já que o embaixador desse país tinha estado no meu escritório um dia antes”, disse Sessions.

Durante as declarações, Sessions prometeu que não investigaria os casos relacionados com o período pré-eleitoral nos EUA em 2016. Foi justamente quando ocorreram seus encontros com Kisliak.

Os EUA são local bem conhecido de Kisliak. Foi ali que ele começou a trabalhar ainda em 1981 como segundo secretário da representação da URSS na ONU, em Nova York.

O russo nunca evitou conversa. Ainda como vice-ministro, ele discutia de bom grado com seus colegas norte-americanos a situação no Irã, o que se confirmou com os vazamentos do WikiLeaks.

Mudança de embaixador

Um jornalista russo que tem ligações com Kisliak e não quis ser identificado diz, porém, que sua relação com a imprensa é muito diferente.  

“Ele é aberto à comunicação pessoal, mas não gosta da imprensa. É uma pena para ele, que já se preparava para se retirar nornalmente, mas agora é chamado de espião”, disse a fonte à Gazeta.Ru.

Já correm há tempos boatos sobre Kisliak, que tem 66 anos, estar deixando o cargo. Mas eles estão mais ligados ao fato de que o Kremlin pensava na necessidade de nomear um novo embaixador nos EUA para impulsionar um reinício nas relações com Washington.

Por ironia do destino, a história dos ataques a Kisliak relembram a alguns observadores a história de seu homólogo norte-americano, o ex-embaixador dos EUA em Moscou Michael McFaul.

Devido a seus encontros com representantes da oposição, ele sofreu ataques da imprensa situacionista, que fez uma imagem de McFaul como de “maestro da revolução laranja”.

Apesar disso, o Kremlin não conseguiu tirar proveito da situação e usar as possibilidades que tinha com McFaul para construir um diálogo informal com Obama.

Publicado originalmente pelo portal Gazeta.Ru.

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