Relações EUA-Rússia ruem sob governo Obama

Os EUA vão ficar bem, diz Obama em última entrevista

Os EUA vão ficar bem, diz Obama em última entrevista

Reuters
Especialistas enumeram motivos para maior esfriamento das relações bilaterais desde o fim da Guerra Fria. Crimeia, Síria, Ucrânia e guinada a Oriente estão entre destaques.

No começo de seu mandato, Barack Obama era a favor do “reset” das relações com a Rússia, mas os conflitos de interesses e suspeitas reduziram os esforços iniciais a nada. No crepúsculo da era Obama, as relações russo-americanas estão em seu nível mais baixo desde a Guerra Fria, apesar da cooperação em algumas áreas.

Em sua última coletiva de imprensa, nesta quarta-feira (18), Obama afirmou que sempre tentou manter laços construtivos com a Rússia. No entanto, na reta final de seu mandato, as relações deixam muito a desejar. Basta lembrar a recente expulsão de diplomatas russos dos EUA e acusações que desestabilizam a ordem mundial.

Ao longo dos últimos anos, Obama fez declarações muito duras contra Moscou, criticando sua política na Ucrânia e seu “apoio ao regime assassino” do líder sírio Bashar al-Assad. O Kremlin, em resposta, passou a acusar os americanos de russofobia e de manterem o desejo injustificado de deter a liderança global.

De boas intenções...

As relações entre a Rússia e os EUA sob Obama nem sempre foram tão ruins. A vitória do 47º senador do estado de Illinois na eleição presidencial de 2008 foi recebida pela Rússia, então presidida por Dmítri Medvedev, com otimismo contido. Obama anunciou planos de restaurar as relações com Moscou, que passavam por uma crise devido à guerra entre Rússia e Geórgia acerca da Ossétia do Sul.

Na época, as relações com o Kremlin giravam também em torno da possível implantação de um sistema de defesa aérea na Polônia e na República Tcheca, e a assinatura de um novo acordo START para limitar as armas estratégicas ofensivas.

Então presidente russo Dmítri Medvedev e seu homólogo americano Barack Obama durante encontro bilateral à margem do G20 em Londres, em 2009 Foto: APEntão presidente russo Dmítri Medvedev e seu homólogo americano Barack Obama durante encontro bilateral à margem do G20 em Londres, em 2009 Foto: AP

Escudo da discórdia

O processo de “reset” das relações lançado por Obama e Medvedev deu resultados em seus primórdios. Em abril de 2010, ambos os presidentes assinaram o acordo START-III, que estabelecia as “regras do jogo” em assuntos nucleares até 2021. Os países se comprometeram a reduzir o número de ogivas nucleares para 1.550 unidades e o número de mísseis para 700 unidades.

Além disso, segundo Obama, os Estados Unidos também teriam favorecido a adesão da Rússia à OMC (Organização Mundial do Comércio), em 2012.

O primeiro grande ataque contra a retomada de relações foi a implantação prevista de um escudo antimíssil na Europa, acredita Evguêni Minchenko, presidente da holding de comunicações Minchenko Consulting. “Apesar do sucesso na assinatura do START-III, os americanos anunciaram seu programa para a implantação do escudo antimíssil na Europa Oriental, e este foi o início do esfriamento das relações”, diz.

Nem mesmo as declarações de líderes americanos de que o escudo antimíssil estaria dirigido contra o Irã, e não contra a Rússia, convenceram Moscou.

Gaddafi, Bolótnaia e outros

Em meio a isso, uma onda de acontecimentos foram se sobrepondo uns aos outros e agravando as relações entre os dois países: a Primavera Árabe e a operação dos EUA em países europeus e na Líbia (2011). “A morte de Gaddafi gerou fúria na Rússia”, recorda Aleksêi Arbatov, presidente do programa “Problemas de não proliferação” no Centro Carnegie, em Moscou. Para o governo russo, a guerra civil na Líbia e sua desintegração é resultado da política irresponsável e perigosa dos EUA.

Outro marco na degradação das relações bilaterais foram as eleições para a Duma de Estado (Câmara dos deputados na Rússia) em 2011 e os protestos que se seguiram.

“Durante as manifestações em 2011, o governo realmente acredita que os americanos estavam interferindo nos assuntos internos da Rússia”, diz Minchenko.

Após o retorno de Vladímir Pútin à presidência, em 2012, as relações esfriaram ainda mais. Segundo Arbatov, durante o novo mandato de Pútin, a Rússia rejeitou, pela primeira vez desde 1991, “o caminho do desenvolvimento europeu”.  

Moscou começou então a se posicionar como um país eurasiático independente da opinião de Washington e dos demais países ocidentais.

Relações ficaram mais estreitas após subida de Pútin ao poder em 2012 Foto: APRelações ficaram mais estreitas após subida de Pútin ao poder em 2012 Foto: AP

Derrocada final, mas com exceções

A ruptura definitiva entre os EUA e a Rússia veio em 2014, após a reanexação da Crimeia e da guerra civil na Ucrânia, avalia Minchenko. Isso porque os EUA apoiaram a Ucrânia em sua disputa territorial com a Rússia e introduziram sanções econômicas para resolver o que qualificaram como “agressão russa”. No entanto, Pútin afirma que o “reset” já havia fracassado bem antes da Crimeia, ainda durante a guerra na Líbia.

A crise síria, em que Moscou apoia o presidente Bashar al-Assad, e Washington investe na oposição, também teve efeito negativo. A retórica agressiva atingiu seu pico em 2016, após uma nova tentativa fracassada de solução pacífica para o conflito.

“Nas relações EUA-Rússia, reina o espírito da Guerra Fria, com a possibilidade de resultar em Deus sabe o quê”, escreveu, em outubro, o politólogo Fiódor Lukianov.

Apesar disso, segundo os especialistas, mesmo em um período de relações conturbadas, a Rússia e os EUA demonstraram capacidade de trabalhar em conjunto em algumas áreas específicas.

“Com Obama e já no mandato de Pútin, temos trabalhado em conjunto, tanto no programa nuclear do Irã, como no problema das armas químicas na Síria. Mas é uma cooperação pontual, com fins eleitorais”, diz Arbatov. “Em geral, os dois países estão se movendo em direções opostas”, conclui.

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