O que os russos esperam de Trump?

Oposicionista Aleksêi Naválni: "Não entendo por que o Kremlin está a favor de Trump. Ele derrubará os preços do petróleo com a liberalização da extração e da exportação nos EUA".

Oposicionista Aleksêi Naválni: "Não entendo por que o Kremlin está a favor de Trump. Ele derrubará os preços do petróleo com a liberalização da extração e da exportação nos EUA".

Mikhail Pochuyev/TASS
Como no Brasil, corrida eleitoral foi seguida na Rússia com tanto afinco como a nacional. Enquanto oposicionistas russos veem cenário tenebroso, deputados celebram e representantes da Crimeia pedem reconhecimento da integração à Rússia.

Os Estados Unidos elegeram um novo presidente. O candidato republicano, o extravagante bilionário Donald Trump, derrubou a adversária, a democrata Hillary Clinton, deixando em estado de choque não apenas os cientistas políticos, incrédulos com o resultado, mas também os mercados de ações e o site de imigração do Canadá (Citizenship and Immigration Canada), que caiu com a enorme procura vinda dos EUA.

A disputa entre os candidatos foi acirrada, com uma diferença percentual muito baixa. Ao final da corrida eleitoral, parecia que todos estavam contra Trump: os democratas, o establishment norte-americano, os patrocinadores e até o próprio partido.

Às vésperas das eleições, os dirigentes do partido Republicano exigiam o afastamento do candidato, alegando que, em caso de vitória, ele seria "o presidente mais insensato da história americana".

Mesmo assim, o "outsider" Trump, ultrapassando o "número mágico", ou seja, a barreira dos 270 votos (de um total de 538 do colégio eleitoral), venceu as eleições. Isso tudo sem ter qualquer passado político.

Suas relações com a Rússia foram um dos pontos mais graves das diferenças de sua retórica quanto à de Hillary. Moscou, claramente, apostou em Trump como o candidato que gerava maiores perspectivas nas relações bilaterais entre os países.

O país fez suas apostas e foi para a frente da TV: em seu último dia, o maior espetáculo dos EUA virou também, a distância, a principal atração da Rússia. Na terça-feira (8), os canais federais russos transmitiam ao vivo as zonas eleitorais norte-americanas, enquanto mesas redondas acaloradas discutiam as eleições nos EUA, assim como comentaristas das mais diversas estirpes - de deputados a diplomatas.

E o primeiro presidente a parabenizar Trump pela vitória, como era de se esperar, foi Vladímir Pútin.

Redessociaisem êxtase

Na manhã desta quarta-feira (9), uma pergunta se repetia por todas as redes sociais russas: "Você está satisfeito ou horrorizado?". O sentimento causado na Rússia pela eleição de Trump foi, realmente, ambíguo.

Afinal, o homem que prometia colocar Hillary na cadeia e erguer um enorme muro de 8 bilhões de dólares para evitar os vizinhos mexicanos - o que se revelava "divertido" para alguns russos - tornou-se agora presidente e tudo tomou um tom mais sério.

"Por que todos estão tão tristes? Por que ninguém está contente? Trump é presidente dos EUA! Isso é assustadoramente divertido, e agora será muito interessante!", escreveu o jornalista Iliá Azar em sua página no Twitter.

Os liberais se mostravam afoitos. "Não entendo por que o Kremlin está a favor de Trump. Eles não leram seu programa eleitoral. O cara vai derrubar os preços do petróleo com a liberalização da extração e da exportação nos EUA", comentou o político oposicionista Aleksêi Naválni.

"Entendo que os norte-americanos, que votaram, ao mesmo tempo, em Trump e na legalização das drogas. Agora só falta se picar e esquecer", escreveu o correspondente da Rádio Ekho Moskvi, Vladímir Varfolomeev, relembrando que na data também se sugeriu a votação pela legalização da maconha em alguns Estados.

O apoio do Kremlin a Trump também gerou diversas piadas entre os russos nas redes, inclusive a de que o norte-americano seria um "agente de Pútin".

"Putin intervened in our elections and succeeded. Молодец" ("Pútin interveio em nossas eleições e foi bem-sucedido. Muito bem!"), escreveu o ex-embaixador norte-americano em Moscou, Michael McFaul, que apagou o Tweet em seguida.

Reconhecimento da Crimeia

"A eleição presidencial norte-americana foi muito mais comentada na Rússia que nossas recentes eleições parlamentares", ressaltou o comentarista da rádio Kommersant FM, Stanislav Kutcher.

O modo como a imprensa russa cobriu as eleições norte-americanas foi visto como mais significativo que qualquer discussão sobre as consequências da eleição de Trump para a Rússia.

Para Kutcher, a cobertura mostrou que, "se os Estados Unidos já não colonizaram a Rússia inteira em 2016, pelo menos 100% de sua imprensa já foi dominada" pelo país.

Segundo ele, o tema foi difundido tão intensamente que deixou transparecer a impossibilidade de se comentar de maneira tão "desinibida e abnegada" sobre a própria política nacional.

Chamado isso de "complexo da própria deficiência", o jornalista concluiu que "quando e se o prime-time da TV americana passar a transmitir, insanamente, todos os detalhes comentados das eleições na Rússia, só então poderemos dizer que nos tornamos grandes".

Já a editora-chefe da agência estatal "RT", Margarita Simonian, escreveu no Twitter: "Hoje vou assim: em uma janelinha nossa bandeira, na outra, a dos EUA. Simbolizo a paz e a amizade. O avanço".

Na Duma de Estado (câmara dos deputados na Rússia), o líder do partido Liberal Democrata da Rússia, Vladímir Jirinóvski, disse que faria um "banquete com champanhe" para celebrar a vitória de Trump, enquanto a senadora da Crimeia, Olga Kovitidi, disse esperar o reconhecimento da península como parte da Rússia pelo novo presidente norte-americano.

Quer receber as principais notícias sobre a Rússia em seu e-mail? Clique aqui para assinar nossa newsletter.

Todos os direitos reservados por Rossiyskaya Gazeta.

Este site utiliza cookies. Clique aqui para saber mais.

Aceitar cookies