Kremlin altera regras de eleições para evitar repetição de fraudes

Presidente da Comissão Eleitoral Central da Rússia, Ella Pamfilova (centro)

Presidente da Comissão Eleitoral Central da Rússia, Ella Pamfilova (centro)

Iúri Martianov/Kommersant
Com votação prevista para setembro, governo vem se empenhando para evitar fraudes eleitorais como as ocorridas em 2011, que resultaram em protestos em grande escala. Conheça algumas das medidas adotadas para garantir um processo mais transparente.

A campanha para as próximas eleições ada Duma de Estado (câmara baixa do Parlamento russo) está a todo vapor, e, se as declarações oficiais foram seguidas à risca, a votação desta vez, que será realizada em 18 de setembro, terá, pelo menos, a aparência de um processo transparente.

“Vocês entendem o quão importante é que esta campanha seja conduzida sem violações”, declarou o presidente russo, Vladímir Pútin, após a recém-eleita chefe da Comissão Eleitoral Central (CEC) Ella Pamfilova dizer que o processo eleitoral “não será do jeito que era antes” e prometer demitir-se se houver uma repetição das ocorrências registradas em 2011, quando a fraude eleitoral por parte das autoridades levou a protestos em massa em várias cidades da Rússia.

A preocupação com a legitimidade é, assim, compreensível. O eleitorado, abatido pela crise econômica, já demonstra sinais de irritação. Atualmente, a última coisa que o Kremlin necessita é de uma repetição dos protestos de 2011. E, seja a intenção do governo atingir esse grau de transparência ou meramente aparentar isso, fato é que o Kremlin tem investido muito para alcançar esse objetivo.

Missão de responsabilidade

Talvez, o movimento mais simbólico do Kremlin tenha sido a própria substituição do diretor da CEC. Era óbvio que as pessoas teriam dificuldade de acreditar na eleição se a comissão continuasse chefiada pelo presidente anterior, Vladímir Tchurov, cuja reputação é bastante ambígua.

Tchurov foi substituído pela ex-chefe da comissão para a promoção da sociedade civil na Rússia, Ella Pamfilova, que foi imediatamente apelidada de “presidente com uma missão”. Pamfilova, que passou a comandar o CEC em março de 2016, já cancelou as eleições locais no subúrbio moscovita de Barvikha – agendada para 24 de abril – depois de denúncias de fraude eleitoral generalizada. Em seguida, Pamfilova ressaltou que a votação de setembro não será como a realizada em Barvikha.

No entanto, analistas políticos acreditam que ela possa se tornar uma dor de cabeça para o governo. “Ela quer ser uma figura mais independente do que Tchurov e está agora reorganizando a hierarquia da CEC para atender às suas necessidades”, explica Pável Salin, diretor do Centro para Estudos Políticos da Universidade Financeira Internacional sob o Governo da Federação Russa.

Espaço para partidos

A redução da quantidade de votos necessários para partidos individuais concorrendo nas eleições da Duma de Estado, de 7% para 5%, é mais um passo que o governo tomou para atenuar a atmosfera política. Infelizmente, a iniciativa não foi proposta antes das eleições de 2011, mas depois, quando o governo já se esforçava para remover os manifestantes das ruas.

Na atual situação, o limiar reduzido deve, teoricamente, ajudar novos partidos a entrarem na Duma de Estado. No entanto, hoje, na Rússia, mesmo em comparação com o início do ano, o número de pessoas que estão interessadas nas eleições permanece em constante queda. E entre aqueles que já se decidiram na votação, uma em cada duas pessoas vai votar no partido governista Rússia Unida.

Consequentemente, as chances de partidos não parlamentares obterem assentos não são grandes. “Na melhor das hipóteses, apenas um desses partidos conseguirá, e este partido pode até ser benéfico para o governo”, diz Konstantin Kalatchev, diretor do independente Grupo de Especialistas Políticos.

“Seja o partido democrático Iábloko ou outro, isso não é importante. O que importa é que um novo elemento entraria na Duma, e isso iria ajudar a legitimar o resultado”, acrescenta.

Círculos uninominais

O próprio sistema eleitoral foi, de certo modo, reformulado. Em vez do conceito de representação proporcional, a Rússia alterou para um tipo misto. Metade dos candidatos estará nas listas dos partidos, e os demais, em círculos uninominais (círculos eleitorais que correspondem a apenas um candidato). Desse modo, a campanha acontecerá sem atenção excessiva para as siglas de partidos, e a disputa principal será travada entre indivíduos.

Os candidatos inseridos em círculos uninominais são mais independentes do governo do que aqueles em listas partidárias e terão que ser levados em consideração. “Isso é concorrência. E onde houver concorrência, intensifica-se o controle sobre a transparência do processo”, afirma Kalatchev.

Debates e primárias

Este ano, a Duma introduziu ainda uma nova norma: todos os candidatos serão obrigados a aparecer em debates eleitorais, ainda que haja pouco apelo entre os cidadãos. Os índices de audiência de debates políticos nos canais de TV estatais são geralmente muito mais baixos e chegam a ser pelo menos duas vezes menores que a média de um talk show ou série.

“Isso ainda não faz parte da nossa cultura”, diz Pável Salin, do Centro para Estudos Políticos, para quem o novo padrão eleitoral mostra que o governo tem a intenção de manter uma relação estreita com o público.

Salin lembra, por exemplo, que o partido governista Rússia Unida até realizou este ano primárias por toda a Rússia, pela primeira vez na história eleitoral do país. “Os outros partidos decidiram não organizar um ensaio das eleições e, portanto, deram ao partido do governo uma vantagem competitiva”, acrescenta. 

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