Conselho de Direitos Humanos desafia decreto de Pútin

Pútin reunido com membros do CDH em dezembro de 2014 Foto: EPA

Pútin reunido com membros do CDH em dezembro de 2014 Foto: EPA

No final de maio, o presidente russo Vladímir Pútin assinou um decreto que classifica como segredo de Estado as informações sobre baixas militares em tempos de paz. Ativistas dos direitos humanos alegam que iniciativa contradiz a Constituição e sugerem mudanças para tornar o texto da norma mais preciso.

O Conselho Presidencial para o Desenvolvimento da Sociedade Civil e Direitos Humanos (CDH) preparou um parecer jurídico sobre o decreto presidencial que classifica como segredo de Estado as informações referentes a baixas nas forças armadas durante operações especiais em tempos de paz.

Segundo representantes do CDH, o decreto, que entrou em vigor no último dia 28 de maio, viola os direitos garantidos pela Constituição da Federação Russa e, portanto, contraria a lei.  

“Não se pode transformar em segredo de Estado a informação referente ao número de pessoas que morreram ou foram feridas”, disse à Gazeta Russa Iliá Chablinski, membro do CDH e professor de Direito na Escola Superior de Economia.

Os membros do conselho afirmam que vão insistir na anulação da norma e na revisão completa da legislação sobre o segredo de Estado. O parecer jurídico será levado agora a votação na comissão do CDH para a Liberdade de Informação e, em seguida, deve ser entregue à administração presidencial.

Contra a lei?

De acordo com o parecer jurídico produzido pelos membros do CDH, as alterações assinadas pelo presidente Vladímir Pútin não estão em conformidade com a Constituição. “Nela pode-se ler que ‘o ser humano, seus direitos e liberdade são um valor supremo’. E aí surge o decreto dizendo que, independentemente de matarem dois, quatro ou mil homens, as pessoas ficam privadas do direito de saber quem foi morto. Como é possível justificar uma coisa dessas?”, disse Chablinski.

Os autores da iniciativa também alegam que o decreto contradiz a lei “Sobre o segredo de Estado”, que inclui uma lista específica de informações classificadas como segredo de Estado. “Ela cita, por exemplo, dados sobre o número das tropas e o grau de sua prontidão de combate, mas não vem sequer uma palavra sobre as baixas humanas”, acrescentou o advogado. “Simplesmente não existe tal provisão! E é por isso que o decreto é contraditório.”

Por esse princípio, a versão anterior do decreto também estaria fora do enquadramento legal, já que versa sobre o sigilo de baixas durante os períodos de guerra. Porém, além da lista que indica as informações classificadas como sigilosas, existe uma outra relação de dados que não podem ser considerados segredo. Entre eles estão informações sobre situações de emergência e catástrofes.

Segundo os especialistas do CDH, a informação sobre baixas militares deve ser abrangida pelo conceito de situação de emergência, “uma vez que existe um fator comum a essas definições: ambas pressupõem acontecimentos que causam a morte de pessoas”.

Diálogo impreciso

Os ativistas de direitos humanos criticam também a imprecisão jurídica da nova norma. “Não existe, por exemplo, a definição de operação especial. E uma vez que não existe o termo, a lei pode ser aplicada de forma arbitrária”, adverte Fiódor Kravtchenko, sócio-gerente da Associação de Advogados para a Mídia.

“Também não está claro que tipo de informação se considera sigilosa, uma vez que o termo ‘baixas’ não é explicado. Podemos então informar sobre o número de feridos? E nas situações em que o número de mortos não é especificado, mas simplesmente se menciona ‘muitos mortos’?”, continua Kravtchenko.

Segundo o advogado, existe a chance de as recomendações do CDH serem ouvidas, bem como eliminadas todas as imprecisões da norma, se o objetivo do presidente e sua equipe não tiver sido “o controle à força da informação nesta área”. “O CDH dá geralmente conselhos muito equilibrados e precisos do ponto de vista jurídico. Esses conselhos não são dirigidos contra o presidente, mas têm antes como objetivo melhorar a precisão das leis”, diz.

No entanto, o analista político e presidente da Fundação Política de São Petersburgo, Mikhail Vinogradov, é menos otimista sobre as perspectivas da iniciativa liderada pelo CDH. Embora nos últimos tempos tenha existido um diálogo entre o presidente e o conselho, o tema das baixas “diz respeito a assuntos delicados, e hoje isso é mais importante para as autoridades russas do que mostrar a reverência perante o CDH”. 

 

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