Onda migratória impõe novo teste à União Europeia

Ilustração: Iorsh

Ilustração: Iorsh

Mudança de paradigmas pode desencadear reaproximação com a Rússia.

A opinião pública e os especialistas russos acompanham atentamente as notícias sobre o fluxo de refugiados na Europa, uma vez que os processos migratórios têm natureza global e quase todos os países da região foram afetados.

Para a Rússia, trata-se também de uma questão atual. Nós últimos tempos, o país não só serviu como ponto de partida e trânsito para refugiados, como também acolheu cerca de um milhão de cidadãos que fugiam de conflitos no sudeste da Ucrânia.

A questão da migração não é, porém, nova para a Europa. O aparecimento do Estado Islâmico e a escalada do conflito no Oriente Médio só intensificaram a tendência antes registrada pela crise econômica e pela instabilidade política na periferia do continente.

O problema é que a Europa não estava preparada para uma onda migratória de tamanha proporção. E várias razões explicam o por quê.

Apesar de terem sido elaborados documentos necessários e de o Conselho da Europa ter definido as medidas para receber refugiados, elas são executadas muito lentamente, e surgem no caminho mecanismos burocráticos para coordenação e tomada de decisão.

A falta vontade política de parte das autoridades locais e o embate entre diferentes pontos de vista sobre o futuro da União Europeia – desde liberais a eurocéticos – tornam a questão ainda mais complexa e de difícil resolução.

O que se vê, enfim, é que os países europeus não estão prontos para decisões e responsabilidades conjuntas. Essa falta de preparo causa conflito entre os líderes da UE, e agora cada país procura se salvar sozinho. Mas isso resolverá o problema?

Acima de tudo, é preciso entender que a situação atual da Europa exige um conjunto de medidas urgentes orientadas tanto para o interior, como para o exterior.

Em primeiro lugar, esse processo requer uma revisão da Convenção de Dublin, que define os critérios para agilizar o processo de candidatura aos refugiados. Também urgente é a unificação das regras e dos procedimentos para a análise de tais pedidos.

Paralelamente, é necessário adotar medidas físicas e administrativas para o reforço das fronteiras, como, por exemplo, aumentar o patrulhamento dos mares e impedir a atuação dos traficantes de pessoas para evitar novas mortes.

Mas também cabe às autoridades da UE e da ONU ajudar os países de êxodo, a fim de reduzir o número de potenciais migrantes, e conduzir esforços diplomáticos para estabilizar a situação no Oriente Médio, sobretudo na Síria e na Líbia.

Quanto aos refugiados que já chegaram ao continente, é de se esperar que a Europa os acolha. Mas isso implica graves riscos. Trata-se, antes de tudo, de uma ameaça terrorista, pois entre os refugiados pode haver extremistas escondidos.

Também não se pode descartar a possibilidade de conflitos interétnicos, tanto entre diferentes grupos de migrantes, que até então estavam em lados opostos da barricada, como com cidadãos europeus que resistem à política de multiculturalismo.

O atual fluxo de migrantes representa, portanto, um teste para a União Europeia, gerando dúvidas até mesmo em relação à continuidade do espaço Schengen e aos próprios valores europeus, antes considerados comuns.

Independentemente do que for decidido, a única certeza é que a União Europeia vai resistir – mas ficará diferente, e seus políticos também ficarão mais moderados. Eles entenderão que há outros fatores a serem levados em conta.

Talvez, por fim, a atual situação faça ainda com que os líderes da UE repensem a atual linha de relacionamento assumida em relação à Rússia. Assim, eles perceberão que os russos não são adversários, e sim parceiros na resolução de muitos problemas, em especial no que se refere às crises na Síria e na Ucrânia.

 

Vladímir Zorin é vice-diretor do Instituto de Etnologia e Antropologia da Academia de Ciências da Rússia e membro do Conselho Presidencial para as Relações Interétnicas.

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