“Qualquer satélite pode ser usado para fins militares”

Associação de Pesquisa e Produção Lavotchkin, nos arredores de Moscou

Associação de Pesquisa e Produção Lavotchkin, nos arredores de Moscou

Aleksêi Filippov/RIA Nôvosti
Historiador especializado em exploração espacial, Anatóli Zak conversou com o portal Gazeta.ru sobre satélites espiões e uso de filmes fotográficos no espaço na era digital.

Quantos países no mundo dispõem de satélites militares?

Anatóli Zak: Todos os países envolvidos em atividades espaciais podem usar os resultados para fins militares. Uma vez que qualquer sistema de sensoriamento remoto para observação da Terra é, via de regra, com o que se iniciam as atividades espaciais de todos os países. E qualquer sistema pode ser usado para fins militares – de inteligência, vigilância, planejamento operacional.

É verdade que, na era digital, a Rússia ainda lança satélites espiões que utilizam filme fotográfico e enviam os resultados para a Terra em cápsulas?

Vamos começar falando que essa concepção era também usada pelos Estados Unidos, basta lembrar detalhes do programa Corona. Os veículos desse programa faziam registros em película fotográfica de grande formato, e estes filmes eram então enviados em cápsulas por paraquedas e apanhados por aeronaves.

Os veículos soviéticos eram muito mais difíceis de manejar, empregando um equivalente da nave espacial Vostok, usada para lançar [Iúri] Gagárin e outros cosmonautas [ao espaço]. Um veículo similar chamado Zenit tinha câmeras, em vez de uma cabine tripulada, e foi também colocado em órbita usando o foguete R-7.

Isso aconteceu na década de 1960, depois esses sistemas foram modificados diversas vezes. A geração seguinte foi dos satélites Yantar, que foram usados sob diferentes nomes por muitos anos, até o presente, embora o conceito e a arquitetura do sistema tenham permanecido os mesmos.

E qual é esse conceito?

Trata-se de uma grande cápsula, que vai acumulando o filme exposto. A cápsula era conectada a um grande telescópio que tirava fotos. O filme exposto era colocado dentro de pequenas cápsulas – cujo número dependia da versão do sistema –, que eram periodicamente enviadas à Terra por paraquedas.

Cada cápsula era o elemento remanescente de uma pequena sonda: tinha um motor com freio, um sistema de orientação etc. Quando o filme terminava, a unidade principal também descia da órbita e trazia o material restante ao solo.

Se tudo corria normalmente, as cápsulas desembarcavam em uma área determinada para pouso na região de Orenburg. Com diferentes nomes, este sistema foi utilizado até recentemente. Há informações de que o último sistema desse tipo foi lançado no ano passado. Esses sistemas eram produzidos em massa e, até que se esgotassem, a possibilidade de lançá-los foi mantida.

Onde são montados os satélites de inteligência russos?

A indústria espacial russa tem uma particularidade que determina as atividades militares e civis. O Centro de Foguetes Espaciais Progress está envolvido no desenvolvimento de satélites de observação da Terra há muitos anos, desde os dias do Zenit, que, aliás, foi transferido para eles a partir da empresa Koroliov, de Podlipki, em meados dos anos 1960.

Há a Sistemas de Informação por Satélite Rechetnev, de Krasnoiarsk, que trabalha com satélites de navegação e comunicações. Além disso, existe ainda a Associação de Pesquisa e Produção Lavotchkin, que por muitos anos fabrico satélites de alerta precoce para detectar lançamentos de mísseis balísticos. Há relatos de que a corporação de foguetes espaciais Enérguia [Energia] faz o mesmo.

Na Rússia, há um sistema de licitação, com a agência espacial russa Roscosmos, que emite diretrizes para cada projeto, e diferentes empresas podem se inscrever para a execução das encomendas.

O governo dos EUA está mesmo preocupado por ter de lançar seus próprios satélites militares com o foguete Atlas, que utiliza os motores russos RD-180?

Para não politizar a situação, eu diria que há dois dispositivos para isso nos EUA – o Atlas e o Delta. O propósito original dos dois foguetes é assegurar lançamentos em caso de qualquer problema, não necessariamente político.

Afinal, você sabe, não só na indústria do espaço, mas também na da aviação, quando há um problema com um portador, todos os outros lançamentos são interrompidos até que a causa dos problemas seja identificada. Portanto, quando há um grande número de lançamentos de sistemas estrategicamente importantes, é muito útil contar com dois sistemas de lançamento diferentes.

E se a Rússia decidir não fornecer os motores, os EUA terão um veículo semelhante, mas que não depende da importação do motor russo. Geralmente, é uma questão de tempo e dinheiro. Aliás, uma abordagem similar já se deu na Rússia – dois foguetes pesados ​​semelhantes, o Angara e o Rus-M, estavam sendo desenvolvidos simultaneamente. No entanto, o último programa foi encerrado por razões financeiras.

Entrevista originalmente publicada pelo Gazeta.ru

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