Para analistas, Brics têm futuro nebuloso

Brics reuniu líderes regionais, mas no comércio sua geografia é dádiva e infortúnio ao mesmo tempo.

Brics reuniu líderes regionais, mas no comércio sua geografia é dádiva e infortúnio ao mesmo tempo.

brics2015.ru
Países buscam novos formatos e mecanismos de cooperação econômica. Neste contexto, Brasil e Rússia têm muito a aprender em e-commerce com Índia e China.

Os países do Brics continuam a buscar novos formatos e mecanismos de cooperação econômica, entre eles para a criação e o financiamento de projetos de investimento.

No segundo semestre de 2016, o Novo Banco de Desenvolvimento do Brics, criado pelos membros do grupo, aprovou uma injeção de US$ 100 milhões na construção de pequenas centrais hidrelétricas na Carélia, região russa que faz fronteira com a Finlândia.

Mas, segundo especialistas em política internacional e economia entrevistados pelo jornal russo “Kommersant”, é incerto o futuro da integração econômica entre Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul.

Alternativa falha

Para o diretor do "Centro de Análise Política e Pesquisas Estratégicas", Evguêni Gnilomedov, o Brics foi um fenômeno especial no sistema das relações internacionais desde o início, já que não se baseava em uma filiação regional, econômica ou política.

Além disso, o grupo nunca teve um líder claramente definido. Esses fatores, segundo Gnilomedov, seriam, ao mesmo tempo, vantagens e deficiências da aliança.

Um fator importante é que o Brics reuniu líderes regionais, possibilitando um aumento em sua influência e autoridade.

"Mas o desenvolvimento das relações dentro do grupo se torna cada vez mais lento. Durante as reuniões, veem-se diferenças significativas nas opiniões dos membros em diversos assuntos. Além disso, as crises financeiras nos países-membros limitaram significativamente as oportunidades para implementação de grande projetos conjuntos”, disse Gnilomedov ao “Kommersant”.

“O Brics é um bloco poderoso, que reuniu países de influência significativa sobre os processos mundiais. Mas não conseguiu atingir o nível do G7 e, assim, não garantiu o policentrismo geopolítico e a diversificação de abordagens para soluçionar problemas regionais e globais", completa.

Além das diferenças políticas e geopolíticas, existem fatores territoriais e econômicos fundamentalmente insuperáveis, de acordo com o analista financeiro da “Finam”, Timur Nigmatullin.

"Devido à distância, a logística complexa dificulta o desenvolvimento do comércio exterior”, diz Nigmatullin.

“No caso de fatores econômicos, uma futura integração é quase impossível. As economias em desenvolvimento ou baseadas na produção de matérias-primas precisam assumir os choques externos que influenciam na política monetária independente e na taxa de câmbio flutuante. Se esses países tiverem uma moeda única, o projeto se tornará muito instável. Assim, todos os negócios dentro do Brics estão condenados a gastos transacionais e logísticos elevados, o que torna o grupo inútil em diversos aspectos", explica.

Fator chinês

O vice-chefe de comércio internacional da Escola Superior de Gestão Corporativa, Vladímir Salamátov, diz que a orientação do Brics em mercados dos países-membros é baixa: em 2016, o comércio mútuo representou apenas 8% das exportações totais dos países Brics. Para efeito de comparação, na União Europeia, 62% das exportações são destinadas ao mercado interno.

A China desempenha papel principal no comercio interior do grupo: Pequim realiza 56% das exportações internas do grupo. Cerca de 43% dessas são destinadas à Índia, que compra equipamentos elétricos e veículos.

O segundo lugar é ocupado pelo Brasil, que, apesar da distância geográfica, é responsável por 18% das exportações internas. Quase 85% das exportações brasileiras são de soja é são adquiridas pela China.

A Rússia ocupa a terceira posição, com 15% das exportações, vendendo principalmente combustível mineral à China.

Já a Índia e a África do Sul são responsáveis por 7% e 4%, respectivamente, do comércio dentro do grupo.

O diretor de pesquisa e análise do banco russo “Promsviazbank”, Nikolai Kascheev, também ressalta a hegemonia chinesa no grupo.

"Os Brics são tão diferentes que quase não têm tarefas de integração. Mas há um potencial objetivo comum de integração: todos eles estão interessados na presença no mercado chinês e querem realizar investimentos financeiros ali. Assim, vemos a liderança absoluta da China novamente. Pequim pode decidir o futuro do Brics, e, hoje, tenho a impressão de que a aliança não é uma prioridade para o país asiático", completa Kascheev.

Meio copo vazio é meio copo cheio

Seria, porém, incorreto falar do fim do grupo, segundo analistas. Com a realização de projetos globais conjuntos e a diminuição da regulamentação estatal do comércio, eles poderão se desenvolver.

O economista especializado em uso de recursos do Extremo Oriente russo, Serguêi Fôkin vê vantagens na geografia dos Brics. Assim, o grupo poderia se formar uma União Aduaneira com territórios de desenvolvimento prioritário, onde cada país teria suas próprias caraterísticas e vantagens.

“Os Brics têm um potencial especial na logística, produção de matérias-primas e construção naval. Esses setores podem ajudar a fortalecer a posição do grupo no mundo. A construção da frota moderna do Brics e os programas ‘Nova Rota da Seda’ e ‘Rota Marítima do Norte’  impulsionarão o crescimento econômico dos países-membros, permitindo a criação de um novo espaço econômico que envolverá outros países desenvolvidos”, diz Fôkin.

“A Rússia tem de tudo para se tornar um player estratégico nesse processo. Mas as diferenças interdepartamentais, corrupção e sabotagem franca de funcionários russos que não querem resolver problemas complexos para não perder os seus cargos, não permitem desenvolver o processo dessa maneira”, completa.

Para a fundadora da plataforma de comércio de exportação B2B-Export.com, Ekaterina Diatchenko, deve-se relembrar que o grupo foi criado pelo analista do Goldman Sachs para unir países com desempenhos econômicos semelhantes.

Desde então, os países tinham ultrapassado diversas mudanças, mas os interesses são os mesmos: aprender a negociar, investir e compartilhar a cultura sem a mediação dos Estados Unidos e da Europa.

"Para uma integração econômica mais profunda é preciso aumentar a confiança mútua. Os institutos estatais de certificação e verificação devem ajudar a encontrar parceiros de confiança e punir os fraudulentos. Além disso, é necessário explorar oportunidades de comércio eletrônico para reduzir custos nas transações e desenvolver rotas de logística. A Índia e a China têm as maiores empresas de e-commerce do mundo, e Brasil, África do Sul e Rússia têm muito a aprender", conclui Diatchenko.

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