A expressão do desgosto social

Mais conhecido no exterior do que na própria URSS, primeiro pintor expressionista soviético ganhou exposição na Galeria Novi Manej, em Moscou.

A galeria Mali Manej, em Moscou, expôs até o final do mês passado a mostra “'Zvérev em chamas”, onde os visitantes puderam apreciar o talento multifacetado de um artista subestimado em seu próprio país.

Dentre os quadros expostos, as 200 obras da coleção do mecenas grego George Costakis mereciam atenção especial. As pinturas milagrosamente sobreviveram a um incêndio de 1976 e foram durante muito tempo consideradas perdidas. As bordas queimadas dão a essas pinturas um encanto particular. Longe de se submeter a seu destino, parecem ter assumido o espírito rebelde do criador.

No entanto, durante a URSS havia certa relutância em expor as obras de Zvérev. O artista tinha que contentar-se com exposições organizadas em casas particulares. Só depois de sua morte, em 1986, o público russo teve acesso a trezentas de suas melhores obras na galeria Tretiakov.

Apesar de não ser muito popular entre os russos, o pintor soviético Anatóli Zvérev, teve grande reconhecimento no Ocidente. A galeria Mot de Paris recebeu a primeira exposição de  Zvérev no exterior em 1965.

Seus estudos suprematistas e fascinantes retratos em aquarela lhe renderam o título de “genial desenhista do século 20”, segundo Pablo Picasso.

Ao descrever o comportamento excêntrico de Anatóli Zvérev não são raras as alusões às produções admiráveis de Salvador Dalí. Foram as obras incatalogáveis de Zvérev, assim como sua fixação por romper com as regras estabelecidas, que aumentaram sua popularidade no outro lado do mundo.

Bon vivant de carteirinha

Nascido em 1931, Zvérev sobreviveu à Segunda Guerra Mundial e morreu aos 55 anos, deixando para trás um legado de trinta mil obras.

Eterno vagabundo e rebelde, Anatóli Zvérev não podia suportar a estagnação nem as normas oficiais, tanto na vida como na arte. Foi expulso da Escola de Arte de Moscou por seu “aspecto indecoroso” e o eximiram também do exército por esquizofrenia.

Tinha o hábito de transformar em arte tudo aquilo que o rodeava. Se não tinha tinta à mão, desenhava com geleia ou beterraba.

“Armado com um pincel de barba, uma faca de cozinha, guache e aquarela se lançava sobre o papel”, conta o artista Dmítri Plavínski. “Derramava água suja, despejava latas de guache, manchava tecidos, e inclusive também os sapatos, alcançando uma mistura de cores. Na sequência, batia com o pincel de barba, fazia duas ou três linhas com a faca e, diante dos olhos de todos, aparecia um perfumado buquê de lírios.”

Embora Zvérev tenha feito retratos de diplomatas ingleses e atrizes soviéticas famosas, nunca juntou dinheiro. “Como se fosse hoje, posso imaginá-lo piscando de modo sem vergonha e dizendo com sua voz rouca: ‘Ei, cara, dê um rublo a este homem”, recorda seu amigo Viatcheslav Kalinin.

Em 1976, depois do incêndio na casa de campo no colecionador grego George Costakis, todos estavam convencido de que o fogo havia destruído grande parte de suas criações. Desesperado, Costakis gritava ao telefone: 

- Pegou fogo em tudo!

- Alguém se machucou? – perguntou, inquieto, Zvérev.

- Não.

- Bom. Quanto aos quadro, pintarei outros…

Os retratos e desenhos de Zvérev merecem um capítulo à parte. “Ainda não foi inventada uma câmera fotográfica que, com a precisão dos pincéis de Zvérev, seja capaz de capturas traços humanos e reproduzi-los com tamanha velocidade e exatidão”, diz George Costakis sobre seu protegido.

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