Uma época de medo e expectativas

Diferentes gerações de russos relembram os acontecimentos turbulentos de agosto de 1991 com uma misturam de incerteza e de esperança.


Há 20 anos, um grupo da linha dura do Partido Comunista da União Soviética tentou derrubar o presidente soviético Mikhail Gorbatchov e, assim, interromper seu programa de reformas econômicas e políticas. Mas a tentativa de golpe fracassou, e os moscovitas se reuniram a Boris Iéltsin, presidente da República Russa, que liderava as massas de cima de um tanque de guerra em frente à Casa Branca, a sede do governo russo.

 

Assim como muitas crianças russas, o estilista lliá Poliveev, 26, presenciou em agosto de 1991 os momentos dramáticos do fracassado golpe contra Gorbatchov na expressão de choque de sua mãe, enquanto a família assistia aos noticiários pela televisão e seus pais sussurravam inquietamente.

 

“Ainda consigo me lembrar de muitas imagens dos noticiários: a sede do governo russo com marcas pretas das chamas e o olhar no rosto de Gorbatchov, que era basicamente o mesmo da minha mãe”, recorda Poliveev, que então vivia na cidade de Magadan, no extremo norte da Rússia.  

 

Gorbatchov, que tinha ficado em prisão domiciliar na Crimeia, retornou a Moscou depois do fracasso do golpe, mas já estava fatalmente enfraquecido como líder, e a dissolução da União Soviética começou quase imediatamente. 

 

A promotora de shows Vera Grant, 26, lembra-se de estar colhendo batatas na casa de veraneio dos avós, perto de Moscou, enquanto os adultos ouviam o rádio. “A tensão era grande”, conta Grant.

 

Apenas 8% dos russos veem os acontecimentos de agosto de 1991 como uma revolução democrática, de acordo com o Centro Levada. Ecoando os sentimentos do primeiro-ministro Vladímir Pútin, 36% dos russos consideram a queda da URSS uma tragédia, e 43% acreditam que o golpe foi nada mais que uma disputa de poder entre burocratas.

 

“Foi uma ilusão de liberdade e de mudanças”, diz o diretor de arte Filip Botchkov. Ele lembra de sua família engatinhando pelo apartamento, próximo à sede do governo em Moscou. Havia rumores na vizinhança de que atiradores se postavam nos telhados dos prédios escolhendo aleatoriamente suas vítimas.

 

“Hoje ninguém luta por nada, mas todo mundo está sempre contra alguma coisa”, diz Grant.

 

A publicitária Natalia Moschkina, 34, levada pela mãe e pela avó às comemorações em frente à Casa Branca, lembra-se da alegria das multidões com o fracasso do golpe. “Havia um espírito de democracia, excitação e fomento social”, diz Moschkina.

 

“Hoje, a maioria dos russos vê a década de 1990 sob uma perspectiva negativa, associando-a ao colapso econômico, ao caos, à degradação cultural, enquanto uma parcela minúscula das pessoas mais socialmente ativas falam sobre a recuperação das liberdades básicas da época”, explica Boris Dubin, chefe do Departamento de Estudos Sociais e Políticos do Centro Levada.

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