Múltiplos traumas de um ataque terrorista

Parentes e amigos homenageiam as vítimas em Moscou / The Associated Press

Parentes e amigos homenageiam as vítimas em Moscou / The Associated Press

Além da tragédia humana, grupos separatistas atingem também a economia russa, tanto no turismo quanto em investimentos estrangeiros.

Um grito seguido de uma explosão. Em seguida, o cenário de um filme de terror. Esse é o maior pesadelo dos russos, e ele voltou a se tornar realidade no dia 24 de janeiro, quando um terrorista suicida detonou uma bomba no hall de desembarque do maior aeroporto da país, o Domodêdovo, em Moscou.

Desta vez, foram 36 mortos e cerca de 180 feridos, bem longe das dolorosas marcas dos ataques ao Teatro Dubrovka, em 2002, quando 170 perderam suas vidas e outros 721 se feriram, ou ainda da invasão da escola em Beslan, na Ossétia do Norte, em 2004, que matou 385 pessoas e feriu cerca de 700.

Mas o que impressionou no Domodêdovo foi a ousadia. Atacar um aeroporto internacional minou praticamente toda a credibilidade de um governo que luta para reforçar a sensação de segurança para seus cidadãos e, consequentemente, para os turistas.

O que pesquisas mostram, no entanto, é que esse esforço não rende frutos em nenhuma das duas frentes. Segundo dados do Centro Russo de Compreensão da Opinião Pública (VTsIOM) publicados no início de fevereiro, 52% dos moradores de Moscou e São Peters-

burgo temem ser, eles próprios ou seus parentes, vítimas de um atentado terrorista.

No âmbito nacional, 80% dos russos compartilham esse medo. Esses altíssimos níveis de temor ultrapassam os índices verificados logo após os ataques ao metrô de Moscou, em março de 2010.

Ainda segundo os especialistas do VTsIOM, para 6% dos entrevistados a melhor forma de conter o terrorismo é com o endurecimento das leis de migração. Para 35% dos entrevistados, eliminar definitivamente o terrorismo é impossível para a Rússia.

Já para a companhia inglesa de análise de riscos Maplecroft, a Rússia saltou do 15º lugar, em 2010, para o 10º lugar, em 2011, no ranking de países que têm maior risco de ataques terroristas. “Avaliar a ameaça terrorista no mundo é imprescindível para um cálculo de risco nos negócios”, diz o diretor da Maplecroft, Alyson Warhurst.

Para Alberto Pinto, tradutor do russo para empresas brasileiras de grande porte, os ataques terroristas são pequenos desastres que vão minando dia após dia a imagem de país seguro, construída a um custo muito alto durante o regime socialista.

“A cada viagem, percebe-se cada vez mais o receio tanto das autoridades quanto de quem chega ao país a negócios. As pessoas perguntam se há riscos, pedem para encurtar a estadia e, em breve, vão começar a evitar lugares públicos”, acredita ele.

Medo que afasta

Foto:  Reuters


A ousadia dos criminosos e sua necessidade de chamar a atenção do mundo para sua causa – ainda que ao custo de muitas vidas – choca pessoas de qualquer lugar do planeta. “Mesmo sem querer, os ataques atingem qualquer um, pois geram compaixão e empatia. Você se projeta, se vê naquele aeroporto, esperando alguém que você ama”, diz a psicóloga Nádia Reis.

Essa empatia, no entanto, influi também na economia. “Sem dúvida, se um turista puder optar entre um lugar seguro e um lugar perigoso, não vai pensar duas vezes para escolher o mais seguro”, completa Nádia.

Em 2004 e 2005, a Rosstat (Agência Nacional de Estatísticas da Rússia) registrou a maior queda no turismo do país, 9,2% e 16,6%, respectivamente.

Em 2004, quatro grandes atentados ocorreram na Rússia: dois ataques ao metrô de Moscou, uma bomba detonada em um voo comercial e o trágico sequestro da escola em Beslan. Somente nesses ataques, 479 pessoas morreram e mais de mil ficaram feridas, de acordo com as estatísticas oficiais.

Segundo André Luís Woloszyn, especialista em terrorismo e consultor de organizações internacionais sobre conflitos, a lentidão do governo em relação aos ataques pode ter impactos devastadores para o turismo e outros setores da economia.

“Uma resposta imediata e com resultados positivos – a identificação dos culpados e sua punição – demonstra que o país está preparado para este tipo de crise e proporciona confiança no poder do governo para debelar tais episódios”, explica.

Woloszyn lembra ainda que o intercâmbio de dados entre as agências de inteligência e intensificação das revistas pessoais são fundamentais para a prevenção de novos ataques, sobretudo em áreas de grande concentração de pessoas. Mas ressalta que o endurecimento das regras de vigilância esbarram na resistência dos cidadãos: “Principalmente os turistas acreditam que tais medidas ferem alguns princípios da Carta de Diretos Humanos e incomoda terem de aguardar horas para embarque ou desembarque, ou verem seus pertences manuseados durante a revista”.

E os riscos tendem a aumenta. Tanto a Rússia como o Brasil vão sediar, nos próximos anos, eventos esportivos que os transformam em potenciais alvos para organizações terroristas – os Jogos Olímpicos (2014 em Sôtchi, 2016 no Rio) e as Copas do Mundo (2014 no Brasil, 2018 na Rússia).

“O Brasil, como qualquer outro país, não está imune a este fenômeno, e eventos internacionais desta magnitude, com a presença massiva da mídia mundial, se constituem em uma excelente oportunidade para ações terroristas, como a que ocorreu nas Olimpíadas de Munique, em 1972”, alerta Woloszyn.

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