Seca e fogo balançam os pilares russos

Analistas estimam aumento nos preços até 3% acima da previsão oficial do governo para 2010/Foto: Peter Kovalev_ITAR-TASS

Analistas estimam aumento nos preços até 3% acima da previsão oficial do governo para 2010/Foto: Peter Kovalev_ITAR-TASS

Incêndios expõem não só a fragilidade da economia nacional, mas a necessidade de modernizar todo o sistema produtivo do país.

O perigo imediato à vida e à propriedade causado pela seca e pelos incêndios catastróficos que assolaram a Rússia na primeira metade de agosto pode ter passado. Seu efeito final sobre a economia do país, entertanto, só será revelado nos próximos meses.

Sabe-se que o custo direto do combate aos incêndios, da reconstrução de casas, da infraestrutura e de outras compensações para as vítimas será de 12 bilhões de rublos (R$ 750 milhões), segundo o Ministério para Situações de Emergência do país.

Analistas preveem, no entanto, que os acontecimentos recentes possam subtrair até 1% do Produto Interno Bruto (PIB) anual, o que significaria uma perda de 460 bilhões de rublos (R$ 26 bilhões) para a economia até o final de 2010.

Os agricultores parecem ser os maiores prejudicados. A seca e os incêndios combinados destruíram um terço da colheita de grãos do país.

Os produtores, que já enfrentavam o peso das dívidas decorrentes da crise econômica mundial, agora se veem diante de um corte dramático da renda.

Os bancos também serão afetados. Especula-se que até 127 bilhões de rublos das dívidas que os agricultores têm com as instituições, especialmente com o Sberbank e o Rosselkhosbank, terão de ser renegociados.

As companhias de navegação e transporte, por sua vez, também sentirão o choque, à medida que as exportações de grãos vão encolher.

Medidas protecionistas

O governo suspendeu todas as exportações de grãos em meados de agosto, e o volume total embarcado, principalmente para o Oriente Médio, não deve ultrapassar 4,5 milhões de toneladas em 2010, contra 21,5 milhões de toneladas no ano passado.

Isto fez os preços globais aumentarem sem parar, uma vez que a Rússia era o terceiro maior exportador do mundo.

Iniciaram-se insinuações de que o país poderia ser forçado a importar cerca de 5 milhões de toneladas e o Ministério da Agricultura russo agiu rapidamente para rebatê-las.

“Este rumor foi iniciado por comerciantes de grãos inescrupulosos, com o fim de esquentar as discussões do mercado e desencadear uma demanda irracional de grãos”, afirmou um funcionário.

Entretanto, os efeitos a longo prazo poderiam ser bem mais profundos. Com sua produção crescendo acentuadamente nos últimos anos, a Rússia tinha a intenção de se tornar a maior produtora de grãos do mundo.

Agora, seus contratos de exportação serão preenchidos por outros países. Quão rapidamente a colheita russa poderá se recuperar, e quão facilmente ela poderá reivindicar de novo aqueles contratos, ainda são questões abertas.

Carne pode encarecer

Por outro lado, como os grãos são a base da pecuária, pode haver um aumento significativo no preço da carne, dos ovos e do leite no rastro da catástrofe.

Produtores de alimentos e varejistas enfrentam o dilema de precisar equilibrar preços mais altos dos fornecedores e o desejo desesperado do governo de tentar refrear a inflação.

Vários moinhos e panificadoras já estão sendo processados por extorsão de preços, enquanto a rede de supermercados Sedmoi Kontinent e o produtor de laticínios Wimm-Bill-Dann entraram numa guerra de preços.

Vale lembrar que a tragédia aconteceu bem no momento que a economia vivia uma fase favorável depois da crise que desestabilizou o país no final de 2008.

Quando a Rússia começava a se reequilibrar, a fumaça envolveu Moscou.

Volta da inflação

As cifras de julho mostram que a onda de calor pode ter desestabilizado o frágil cenário macroeconômico para o ano no país.

As companhias cortaram horas de trabalho e retardaram os investimentos. Além disso, embora a produção industrial tenha subido 5,9% e o investimento, 0,8%, houve uma queda de cerca de 10% nos resultados.

“Os investimentos caíram mais do que se esperava e os dados de agosto poderão ser ainda mais fracos”, afirmou Olga Sterina, da coorporação financeira UralSib.

É o velho bicho-papão da inflação russa que dá as caras novamente. A luta do país contra o aumento dos preços foi quase permanente durante a última década, à medida que sua economia se expandia rapidamente.

Mas a desaceleração na demanda chegou com as nuvens sombrias que a crise econômica fez pairar sobre a Rússia no ano passado. A maioria dos analistas agora eleva suas previsões para aumentos nos preços de consumo para 2010, alguns em até 3% acima da previsão oficial do governo - de no máximo 7%, o mais baixo em muitos anos.

Depois de 20 anos, junho viu pela primeira vez as taxas de juros se tornarem reais, isto é, mais altas que a inflação. Mas as taxas de juros negativas já estavam de volta em julho, o que frustrou aqueles que acreditavam que esse seria o instrumento usado pelo Banco Central da Rússia para conter a inflação.

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