Renúncia de tsar Nikolai 2° completa 100 anos

Tsar Nikolai 2° lê o Ato de Renúncia a mensageiros em seu vagão privado em Tsarskoie Selo.

Tsar Nikolai 2° lê o Ato de Renúncia a mensageiros em seu vagão privado em Tsarskoie Selo.

Getty Images
Comentários de políticos, diplomatas e religiosos criam panorama da abdicação do último imperador russo há exatos 100 anos, em 15 de março de 1917, e seu significado para a história do país.

Há exatos 100 anos, em 15 de março de 1917, o tsar Nikolai 2° assinava o “Ato de Renúncia”. O evento, como ressaltam historiadores, teve importância fundamental para a revolução russa.

“Ao assinar o Ato de Renúncia, nem Nikolai 2°, nem ninguém de seu círculo pensava que a monarquia na Rússia entrava em colapso. Ele o assinou para conceder o direito ao trono a seu irmão Mikhail, mas, sob inflluência dos cadetes, assinou também sua abdicação do trono russo até a decisão da Assembleia Constituinte. Não se sabe em que medida Nikolai 2°participou na redação do texto do Ato de Renúncia, mas esse tinha sua assinatura”, diz o chefe dos arquivos estatais da Federação da Rússia, Serguêi Mironenko.

A Gazeta Russa reuniu comentários de personalidades importantes para o ocorrido:

George Buchanan (1854-1924), embaixador da Grã-Bretanha na Rússia:

Como a única solução possível para a desordem era a guerra civil, o imperador russo entregou, em 15 de março, um telegrama ao general Ruzski, para que esse o enviasse a Petrogrado, anunciando sua renúncia em favor de seu filho. Algumas horas depois, a majestade convidou o professor de medicina Fiôdorov e pediu que esse lhe falasse o que achava da saúde do príncipe herdeiro. Ao ouvir que o filho tinha uma doença incurável e que podia morrer a qualquer momento, o imperador disse: “Já que Aleksêi não poderá servir a sua pátria como eu desejava, tenho o direito de ficar com ele”. Depois, quando, chegaram a Pskov, à noite, dois membros da Duma, Gutchkov e Chulguin, o imperador lhes incumbiu de um decreto em que abdicava o trono em favor de seu irmão.

Georges Maurice Paléologue (1859-1944), embaixador da França na Rússia:

O trem imperial chegou a Pskov à noite, às 20h. O general Ruzski se apresentou imediatamente diante do imperador e lhe demonstrou, sem dificuldades, que esse devia abdicar. Citou para ele opinião similar do general Aleksêiev e de todos os comandantes do exército, os quais havia consultado por telegrama. O tsar ordenou que o general Ruzski informasse ao presidente da Duma, Rodzianko, sua intenção de renunciar ao trono.

Karaúlov (1878—1917), deputado da Duma de Estado:

O tsar Nikolai 2° abdicou o trono em favor de Mikhail Aleksandrovitch. Esse, por sua vez, abdicou o trono em favor do povo. Na Duma, ocorrem grandiosos protestos e aclamações. O entusiasmo foi indiscritível.

Metropolita Evlogui Gueorguievski (1868-1946):

O manifesto de abdicação do tsar foi lido na catedral pelo protodiácono em lágrimas. Entre os que rezavam, muitos estavam aos prantos.  Um velho tinha rios de lágrimas correndo.

Do diário do camponês Zamaráev, da região de Vólogda (500 km a norte de Moscou)

Nikolai Românov e sua família foram destronados, estão presos e conseguem todo seu alimento como os outros, por meio de cartões, naturalmente; ele não se preocuparam o suficiente com o bem-estar do povo e a paciência do povo acabou. Eles levaram seu país à fome e à escuridão. O que fizeram na corte. Um horror e uma vergonha! Quem governava o Estado não era Nikolai 2°, mas o bêbado Rasputin. Todos os príncipes foram substituídos e demitidos, entre eles o comandante-chefe Nikolai Nikolaevitch.

Silvestr (1860-1920), epíscope das regiões de Omsk e de Pavlodar:

Nas circunstâncias atuais, um tsar absolutista não podia continuar a administrar um país tão grande. Era preciso que o próprio povo, representado por pessoas por ele escolhidas, tomasse parte na administração. Mas o tsar não o fez. E, como consequencia, houve o golpe de Estado. O curso inevitável da vida obrigou o imperador Nikolai 2° a renunciar ao trono. Foi como acabou o juízo de Deus quanto a nosso tsar Nikolai 2°, como na antiguidade quanto a Saul.

Vassíli Rôzanov (1856-1919), filósofo, escritor e articulista religioso:

A Rus se extinguiu em dois dias. No máximo, em três. Até a “Era Moderna” não pode terminar tão rápido, como terminou a Rus. É surpreendente que ela tenha desmoronado inteira de uma só vez, até as menores partes. E tal comoção nunca houvera, mesmo levando em conta as invasões bárbaras.

Grã-duquesa Olga Aleksândrovna (1882-1960)

Por todos esses anos críticos, os Românov, que poderiam ter sido um apoio sólido ao trono, não foram dignos de seus títulos ou das tradições familiares. Nós, os Românov, mergulhamos demais no mundo do egoísmo, onde há pouco bom senso, isso além da infindável satisfação de desejos pessoais e ambições. Mas quem deles se preocupava com a impressão que causava? Ninguém.

Marc Ferro (1924-)

O reinado de Nikolai 2°, imposto pelo destino, tornou-se um pesadelo: ele sobreviveu a duas revoluções, foi testemunha de desenas de ataques a seu círculo, presidiu uma Duma que não queria ter criado, participou de suas sessões, assim como das intermináveis sessçoes do Conselho de Ministros. Além disso, ele teve que entrar em guerra duas vezes, quando queria ser o apóstolo da paz. Após longo aprisionamento, foi morto, enquanto antes e depois da abdicação sua maior preocupação foi com a saúde do filho, o único herdeiro, que sofria de incurável hemofilia.

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