Com Bolshoi, brasileiros da companhia retornam à terra natal

Casal diz que "vida seguiria" se apenas um tivesse sido selecionado pelo lendário teatro e que "não adianta ter amor sem construir nada".Foto:Sergio Almeida

Casal diz que "vida seguiria" se apenas um tivesse sido selecionado pelo lendário teatro e que "não adianta ter amor sem construir nada".Foto:Sergio Almeida

Em turnê pelo país, Erick Swolkin e Bruna Gaglianone falam sobre como é integrar a trupe do Teatro Bolshoi de Moscou

 

Em um hotel no centro de São Paulo, onde esteve hospedada a trupe do Balé Bolshoi durante as apresentações de "Spartacus" e "Giselle" na cidade, o casal de bailarinos brasileiros Eric Swolkin, 25, e Bruna Gaglianone, 24, recebeu a Gazeta Russa para falar sobre a carreira, a vida em Moscou e perspectivas para o futuro:

Vocês já moram e trabalham em Moscou há três anos. Como é ser um bailarino do Teatro Bolshoi?

Erick Swolkin: Em primeiro lugar, sinto-me plenamente realizado profissionalmente. Eu e Bruna estudamos e trabalhamos muito aqui no Brasil, para realizar este sonho: foram oito anos na Escola do Bolshoi [em Joinville, Santa Catarina] e mais preparação anos antes. Neste momento especialmente, realizo um sonho: estar aqui, no meu país, em turnê com o Bolshoi, dançando em espetáculos tão significativos como "Spartacus" e "Giselle".

Bruna Gaglianone: Para mim, é uma responsabilidade enorme. Eu poderia comparar a um jogador de futebol brasileiro que entra pra seleção. Todos os dias tenho que provar que posso dançar em um dos melhores teatros do mundo. É um desafio que requer 100% de mim todos os dias. Estou orgulhosa e feliz por estar nesta posição privilegiada, porque somos dos poucos bailarinos estrangeiros na trupe permanente.

Há outros estrangeiros além de vocês?

Bruna: Sim, tem uma bailarina da Coreia, um dançarino japonês que recentemente terminou suas atividades, nossa conterrânea Mariana Gomes e logo mais outro dançarino brasileiro vai entrar para a trupe.

Como dançarinos brasileiros entram numa trupe permanente? Há algum processo de seleção especial?

Bruna: Infelizmente, não existe um processo de seleção definido. A escola no Brasil é autorizada a usar o nome do Teatro Bolshoi, mas não tem uma conexão direta como, por exemplo, a Escola de Balé Vagânova em Moscou. Tivemos muita sorte, porque nos inscrevemos na primeira seleção que o Teatro Bolshoi abriu para dançarinos estrangeiros em 2011.

Bruna Gaglianone Foto: Daniil Metelkin

No Brasil, vocês estão em turnê com apresentações de Spartacus e Giselle. É um programa especial ou repertório principal do teatro?

Erick: É o repertório principal, porque na verdade o Bolshoi não faz performances especiais só para a turnê. A turnê do Teatro Bolshoi em si é um evento muito especial em qualquer país. Geralmente, as performances lendárias do Grigorovich [Spartak] ou Vassíliev [Giselle] são escolhidas para a turnê. Elas são patrimônio da coreografia russa!

Bruna: O Bolshoi é famoso há décadas por causa de sua escola, com sua hierarquia e sistema. O teatro nunca irá, por exemplo, me dar um papel diferente só porque estamos em turnê pelo Brasil e eu sou brasileira. Dançamos o mesmo papel na Rússia ou em outros países.

Que países vocês já visitaram em turnês com o Bolshoi?

Bruna: Em três anos, já dançamos no Reino Unido, EUA, Austrália, Japão, China e Cingapura.

E sua vida em Moscou, fora do teatro, como é?

Bruna: A gente não tem muita vida social. Na verdade, quase não temos tempo livre. Passamos praticamente o dia todo no teatro, das 10h às 23h. Quando temos folga, às segundas, tentamos dormir um pouco mais, colocar o apartamento em ordem, lavar roupas, fazer todas as tarefas domésticas.

Erick: Teoricamente, poderíamos sair na noite de domingo, mas até para isso já estamos muito cansados, e queremos só relaxar em casa. Quando o clima está agradável, no verão russo, gostamos de correr, caminhar e patinar no parque Górki. No inverno, é claro, preferimos passar o tempo em casa.

Quais são seus lugares favoritos em Moscou? E quais recomendariam para os turistas brasileiros?

Bruna: Adoro o parque Górki. Especialmente no verão, quando parece que você não está em Moscou.

Erick: Eu adoro o Teatro Bolshoi... (Risos) Além disso, gosto de museus. Especialmente, o do Kremlin, o Museu do Tesouro, a Galeria Tretiakov. Passeamos com nossos pais por esses lugares quando eles vieram nos visitar. Na verdade, eu acho que ainda conheço pouco  Moscou.

Bruna: Gostamos também da travessa Kamerguêrski e da trattoria italiana "Veneza". A comida italiana é mais parecida com a brasileira.

Erick: Para comida russa, costumamos ir ao Iôlki-Palki. Quando amigos brasileiros vão nos visitar, os levamos lá. É muito bom para provar a cozinha tradicional Russa.

Erick Swolkin Foto: Daniil Metelkin

Do que vocês sentem mais falta do Brasil?

Erick: Do calor! Para mim, é muito frio no inverno. Foi muito difícil no início, quando chegamos. Agora, é claro que estamos um pouco acostumados. Sinto falta também da carne brasileira. Em Moscou, o sabor da carne é diferente. Sinto muita falta do mar, da praia. Eu venho de São Paulo, e vivi muitos anos em Joinville. Lá não tem litoral, mas podemos ir à praia rapidinho, em uns 40 minutos.

Bruna: De que eu mais sinto falta é da minha família e do sol. Principalmente nas manhãs de inverno, quando acordo e está escuro, e vou para cama e está escuro. É muito difícil! Não gosto de pegar sol na praia, mas ver e sentir o sol é muito importante para mim.

Quais são os seus planos para o futuro?

Bruna: Eu danço no Bolshoi há apenas três anos, e a carreira neste ramo deve durar cerca de 20 anos apenas. Claro que sonho em me tornar solista, a primeira bailarina. Mas isso não é fácil, é necessário perseverança e um pouco de sorte. No futuro, gostaria de me tornar professora de dança, por exemplo, na Escola do Bolshoi ou em uma escola própria.

Erick: Gostaria de continuar a trabalhar no Bolshoi até quando for interessante e eu puder crescer. No futuro, eu também gostaria de voltar para o Brasil a ensinar crianças a dançar.

O que vocês acham sobre o Bolshoi como um local de trabalho, sobre seus colegas?

Erick: Todo mundo tem essa visão de filme de que bailarino é ruim, que um quer machucar o outro. Eu também achava isso no primeiro ano, quando eu cheguei. Pensei que seria excluído, mas ocorreu o contrário. Lembro que tinha medo, porque no Brasil há o estereotipo do russo ser uma pessoa má e brava. E quando cheguei lá, fui super bem tratado pelos colegas de trabalho. Acho que eu aprendi a falar um pouco do russo devido à convivência e à ajuda deles. Existe intriga, existe competição, mas isso também existe dentro de qualquer família.

 

Bruna: Como em uma família, a gente convive o dia inteiro, ne? A gente vai brigar, mas depois cinco minutos está fazendo as pazes.

Se só um de vocês fosse escolhido para entrar no Bolshoi, como fariam?

Erick: Temos perfil diferente, achávamos que não entraríamos na mesma companhia. Tínhamos uma certa consciência de que cada um seguiria o seu caminho. Se fosse para dar certo, daria certo à distância. Sempre mandamos os vídeos para seleção juntos. A sorte estava ao nosso lado: entramos para o Bolshoi.

Bruna: Claro, ninguém vai deixar a carreira por causa do outro. Se não desse certo, a vida seguiria. Não adianta ter amor se não construirmos nada. Cada um iria para um lado.

 

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