Como são feitos os casacos de pele russos

A Rússia permanece sendo um dos principais países consumidores de casacos de pele no mundo, o que faz com que muitas pessoas continuem a se ocupar desta produção dispendiosa e, às vezes, perigosa para a saúde.

 

Foto: Mikhail Sinítsin

A confecção de um casaco de pele ainda é quase toda manual: entre algumas dezenas de peles, o peleteiro seleciona aquelas que poderão ser combinadas para “montar” um casaco.

“A seleção das peles é feita de acordo com o tipo de pelagem, cor e textura –mais lisa ou mais felpuda. Não existem animais idênticos, por isso, para que algumas unidades que combinam possam ser selecionadas, são necessárias dezenas de peles”, conta Iulia Shamkina, peleteira da fábrica de peles MaryBelle.

A fábrica onde Iulia trabalha ocupa parte de um antigo edifício no centro de Moscou. Ali também situa-se a sua loja, onde os clientes podem encomendar a confecção de um artigo novo ou a reforma de um casaco já pronto. É com isso que se ocupam os peleteiros, tecnólogos, alfaiates e especialistas em reformas que trabalham no local.

Os casacos de pele são confeccionados a partir do produto semimanufaturado, que, antes disso, já passou por várias etapas preparatórias.

"Compramos peles em leilões de todo o mundo e as trazemos para Moscou. Em seguida, enviamos para o processo de curtimento na Europa e, depois, trazemos novamente a Moscou. Isso é incômodo e muito caro, mas é muito fácil danificar uma pele da melhor qualidade durante o processo de curtimento. Além disso, um produto químico tóxico, o percloro, é utilizado no tratamento das peles na Rússia e nós não podemos arriscar a saúde de nossos colaboradores e clientes. Por isso, realizamos um tratamento mais caro e ecológico”, relata Herman Shalumov, cofundador da fábrica de peles.

Para a produção de casacos de pele “do zero”, as peles são selecionadas, penteadas e examinadas e, somente depois, são cortadas de acordo com os moldes. Em seguida, as peças são costuradas uma à outra em uma máquina especial, chamada de máquina de peleteiro. Ali, os equipamentos são os mais diversos: desde unidades modernas até aquelas que foram fabricadas há décadas. Ao mostrarem uma das máquinas de fabricação alemã, os especialistas relatam que, atualmente, o seu valor equivale ao preço de um BMW X6 novinho, apesar de a máquina ter sido fabricada ainda em 1941.

Conservadorismo

O conservadorismo do trabalho é uma das principais características da produção de peles, que não podem ser passadas a ferro, o que poderia queimá-las. As peças que irão compor o futuro casaco são deixadas de molho na água, depois são fixadas em um pedaço de madeira com uma pistola pneumática para que sequem e assumam a forma desejada, processo que substitui o ato de passar.

O pelo fica constantemente voando no ar, por isso a atividade é vedada a pessoas alérgicas e aos portadores de asma brônquica. Os peleteiros brincam dizendo que a coriza pode ser chamada de doença "profissional".

Na oficina visitada pela reportagem, trabalham exclusivamente mulheres. É possível que a disparidade de gênero esteja relacionada precisamente com a sutileza do ofício. No entanto, elas não reclamam do trabalho. A tecnóloga Olga Vorontsov, por exemplo, desenvolveu suas habilidades profissionais em treinamentos realizados na Rússia e na Itália. De acordo com ela, o negócio de casacos de peles na Europa é menos dinâmico que o russo.

“Aqui há um movimento constante. Moscou é a primeira a captar todas as novas tendências e isso não diz respeito apenas à produção, mas também às soluções de design", diz Olga, que tem formação superior em arquitetura, o que, segundo ela, ajuda bastante no trabalho.

Ela conta, no entanto, que é preciso adicionar algo novo aos conhecimentos constantemente. Os cursos de aperfeiçoamento ocorrem na própria fábrica, onde os especialistas são capacitados; os que se saem melhor são enviados para estudar no exterior.

Especialistas da fábrica que não quiseram ter os nomes citados reconheceram que ainda existe carência de formação profissional especializada: as escolas técnicas onde os peleteiros recebem treinamento estão sendo fechadas, e o governo não se mostra interessado em criar novas instituições para os especialistas que estão no ramo da produção dos casacos de pele.

Etapas

A produção de artigos de pele pode ser dividida em quatro etapas. A primeira é a criação de animais destinados ao comércio de peles. Na URSS, existiam cerca de 300 grandes fazendas voltadas para esse tipo de criação. Há 30 anos, o país era líder em produção de peles. Atualmente, existem no máximo 30 empreendimentos, praticamente todos privados.

De acordo com Aleksandr Saidinov, diretor geral da Fazenda de Criação de Animais Reprodutores, o Estado ajuda pouco os peleteiros, que recebem subsídios para a criação de animais reprodutores. Mas, quanto ao resto, eles estão praticamente "abandonados". De acordo com Saidinov, só em 2013 foi preciso gastar 300 mil euros para a compra de equipamentos para o centro de preparo de alimentos.

A segunda etapa importante é a venda de peles nos leilões: assim como as pedras preciosas, elas são vendidas apenas através de cinco casas de leilões no mundo, em Copenhague, Helsinque, Toronto, Seattle e São Petersburgo. Depois do leilão, as peles são encaminhadas para o curtimento. Lá, são colocadas de molho, a camada subcutânea de tecido adiposo é removida, elas são esticadas, escovadas e depois transformadas em um produto semimanufaturado para a indústria de peles.

O curtimento é a etapa mais perigosa da produção.

"Ao longo de todo o processo, trabalhamos com ácido acético e ácido crômico para o curtimento e para eliminar a gordura da pele. Frequentemente, utiliza-se a gasolina. Você é obrigado a trabalhar usando um respirador”, relata o peleteiro Valeri Titov, funcionário da empresa Pervii Mekh.

O curtimento leva algumas semanas. Depois disso, as peles seguem para as fábricas de artigos de pele.

 

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