De Púchkin a Krilov, histórias da Rússia para crianças

Foto: divulgação

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Editoras brasileiras oferecem boas opções de leitura infantil por escritores clássicos russos.

Galo e cuco trocam elogios, quando são interrompidos por um Tico Tico, crítico sincero: “por mais que em mútua louvação/os dois vos revezes até ficardes roucos,/ como cantores, vossos dons são poucos”.

Na fábula curtinha de Krilov(1769 - 1844), uma amostra do humor com o qual conta tantas outras. “Então que história é esta? Por que razão aqueles dois se louvam sem parar?”, pergunta o narrador, no arremate, para responder na sequência: “Se o Galo louva o Cuco, a só razão é que o Cuco louva o Galo, irmão!”

Nove histórias breves, incluindo “O Cuco e o Galo”, integram cada um dos dois volumes das “Fábulas de Krilov”, traduzidas e adaptadas por Tatiana Belinky para a editora Manole, com ilustrações de João Lin em tons vivos.

Os animais são personagens recorrentes, como nas aventuras do lobo e a raposa, a dos dois cães, a do macaco de óculos ou a do gavião, a truta e a lagosta. Suas desventuras se devem invariavelmente à ambição desmedida, inveja, falta de senso e vaidade.

Um dos maiores nomes da literatura infanto-juvenil do país, Tatiana Belinky (1919-2013), que chegou da Rússia aos dez anos, se incumbiu de trazer para crianças brasileiras os contos de sua língua natal.

Krilov é o mais conhecido fabulista russo do século 19, autor de um cerca de duzentas fábulas.

Comparado por vezes a La Fontaine, de quem foi tradutor na Rússia, tem uma obra de características próprias, menos moralista e mais satírica, em que se nota sua crítica à sociedade russa de sua época, motivo de sanções políticas que vai sofrer – morre tragicamente após um duelo, mas por amor.

Ao mesmo tempo em que as historinhas selecionadas de Krilov mantêm certa ingenuidade, razão por que podem ser lidas pelos de pouca idade, guardam certa sutileza que também cativa adultos.

Como no diálogo em que a pipa diz à borboleta: “Mal posso te enxergar daqui, creias ou não! Eu acho que tu me invejas por voar alto assim!”. E não se abala a borboleta: “É bem verdade que eu voo baixo; mas voo em liberdade”.

Entre os brasileiros, as fábulas e contos da Rússia são menos conhecidos que os da tradição ocidental, como os do próprio La Fontaine, Andersen e os Irmãos Grimm.

De riqueza igualmente grande, a tradição popular russa serviu de inspiração a grandes autores, de Púchkin a Tolstói. Uma amostra desse acervo, também dirigido a crianças, com tsares, cossacos, tocadores de harpa gusli, é apresentada também por Tatiana Belinky em “Sete Contos Russos”, ilustrados por Odilon Moraes, da Companhia das Letrinhas.

O populário russo compõe-se de bilinas, que são narrativas poético-épicas, predânias, relatos da velha tradição, e skázkas, contos de fadas, como explica a autora e tradutora na apresentação. Algumas histórias são da época pagã, anteriores ao cristianismo - que só chegou à Rússia no século 10 - , povoadas de figuras da mitologia eslava antiga.

Como heróis, surgem os bogatires, atletas dotados de força extraordinária. O mais popular é Iliá Múromets, que, no conto da antologia, rivaliza com o príncipe Vladímir, figura histórica cercada de lendas.

Entre os vilões, destacam-se Kochtchêi, talvez o maior de todos, a bruxa-canibal Baba Iagá, a temida sereia Russalka e Liêchi, duende das florestas. Incluem-se também divindades, como Kupála, da alegria, e Pierún, do raio, além de personagens imaginários como o dragão, o pássaro de fogo, a serpente voadora.

O mais recente título russo para crianças a chegar às prateleiras brasileiras é “O conto maravilhoso do tsar Saltan”, de Aleksandr Púchkin, com tradução e adaptação de Cecília Rosas para a Cosac Naify.

                                                                                                                                                     

O grande poeta russo – que serviu de influência para Gógol, Dostoiévski, Akhmátova - também fez histórias que podem ser lidas por crianças.

Seu conto de fadas tem um príncipe, madrasta má e feitiços: são o tsar Saltan, duas irmãs invejosas e sua mãe que fazem o possível para separá-lo da jovem tsarina, que vai dar luz ao filho Guidon, ajudado por um misterioso cisne-princesa a trazer de volta a felicidade para a família.

Da mesma coleção, intitulada “Os Mais Belos Contos”, em formato grande, capa dura e papel couché, saíram outros dois grandes mestres, Anton Tchekhov, com “Kachtanka”, e Nikolai Gógol, com “O nariz”, ambos com tradução e adaptação de Rubens Figueiredo. Os três volumes são ilustrados pelo russo Guenádi Spírin.

“Kachtanka” conta a desventura de uma pequena cadela, assim chamada por ser ruivinha, que se perde do dono até ser encontrada por um palhaço de circo.

Quanto ao conto de Gógol, um dos textos clássicos da literatura russa, conta a absurda história de um nariz que abandona seu posto e função e se torna conselheiro de Estado.

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