Vladímir Makánin e a arte de vencer o texto

Em 1965, Makánin publicou seu primeiro romance, “Linha Direta". Em 1999, foi agraciado com o Prêmio de Estado da Rússia Foto: wikipedia.org

Em 1965, Makánin publicou seu primeiro romance, “Linha Direta". Em 1999, foi agraciado com o Prêmio de Estado da Rússia Foto: wikipedia.org

Escritor conversou com a Gazeta Russa em sua casa.

Como qualquer pessoa do mundo, o escritor Vladímir Makánin é capaz de viver simultaneamente em vários lugares. Um dos seus pontos é uma tranquila casa perto de Rostov-no-Don, com um jardim jovem, balanços e uma varanda acolhedora, onde ele recebeu a Gazeta Russa.

Gazeta Russa - O senhor possui formação em matemática. A capacidade de pensar com precisão ajuda em algo um escritor? 

Vladímir Makánin - A matemática é muito bonita e perfeita, mas, na minha opinião, um pouco fria. Sempre fui um excelente aluno, mas ela não tocou o meu coração. Não foi a universidade que me moldou enquanto pessoa, mas sim o tempo da escola, a época das batalhas nos jogos de xadrez. Eu, um menino da 5ª série, jogava com senhores mais velhos. Dois ou três movimentos antes de perder a partida o senhor começava a suar, a se remexer sobre a cadeira, a fumar (na época ainda fumavam nas competições) e eu, o moleque, ficava sentado, deleitando-me com a situação. Isso era um sentimento de luta insubstituível, que me foi tão útil na vida.

Estou me referindo, em primeiro lugar, a batalha com o texto, do seu leve, até brincalhão, desejo de me derrotar, quando eu, em resposta, agora já não mais um menino, fico me remexendo na cadeira e fumo.

Parece que o senhor escreve facilmente e com naturalidade. Essa facilidade é apenas  aparente? 

De novo ao xadrez. Ao que parece, Alekhine (ou Lasker) disse: "Vence aquele quem sabe como fazê-lo jogando com as peças pretas". Ganhar com as brancas é escrever seguindo os passos de alguém, é acumular pontos de maneira excessivamente fácil. Mas quando você escreve uma história ou um romance em um espaço pouco utilizado e com novos tipos de heróis, esse é o seu jogo com as peças pretas.

Biografia

Vladímir Makanin nasceu em 1937, na cidade de Orsk, nos Urais. Ele se formou na faculdade de Mecânica e Matemática da Universidade Estatal de Moscou e trabalhou como professor em instituições de ensino superior. Em 1965, publicou seu primeiro romance, “Linha Direta". Em 1999, foi agraciado com o Prêmio de Estado da Rússia. Recebeu também o prêmio  Pushkin, da Fundação Töpfer (Alemanha), o prêmio Penne (Itália), o "Booker russo" e o Grande livro. Em 2012, recebeu o Prêmio Europeu de Literatura.

O senhor escreve as suas obras do início para o fim? 

Não, eu  escrevo em partes. Escrevo as cenas-chave aleatoriamente. Às vezes, até começo com o final. É como numa cozinha. Para fritar algo, é preciso ter alguns bons cortes de carne.

O senhor lia muito em sua juventude? 

No tempo da minha juventude não havia tantos livros como agora. Mas eu tive sorte, minha mãe trabalhava como professora. Quando eu estava no nono e no décimo ano ela me arrumava livros de três escritores que estavam de fora da linha comum: Búnin, Kuprin e Leonid Andreev. Li muitas coisas.

Na Universidade, li Remark, muito popular na época. Li os seu “Três Camaradas". Shakespeare também.

Quase todos os seus romances suscitam interesse e muitas controvérsias. É possível prever o sucesso de uma obra?

Existem dois processos: a criação e o consumo. O indivíduo é responsável apenas pela primeira. Ele pode escrever um romance, uma peça, mas ele desconhece de que forma a sociedade vai reagir a isso e não cabe a ele decidir. A sociedade consome aquilo que você cria. Ela pode reconhecer você amanhã e um mês depois pisoteá-lo. Ou reconhecer somente após a morte. Ou não reconhecer nunca. Mas, repito, isso não é problema seu, a sua tarefa é criar.

O prefácio da edição espanhola de "Asana" contém a seguinte frase: "Makánin conseguiu  ver o mundo além da moralidade".

Sem negar a moralidade, foi uma fala hábil, mas eu não ficaria calculando para determinar quem é o melhor e quem é o pior. Simplesmente a vida é assim. Dizem que em "Asana" conseguiu-se olhar de uma forma diferente para um fenômeno como a guerra. Para ser sincero, eu não tinha esse plano, simplesmente aconteceu.

Eu não conseguia escrever de uma maneira diferente. Eu não consegui descrever a guerra de trincheiras. E nem sequer havia lá uma guerra de trincheiras. Havia a guerra de ladrões, de feira, de mercado e foi assim que saiu. A prosa não está onde atiram e sim onde se arrepia a vida interior.

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