Bombardeio de influências teatrais

Paulo Gircys em Ulisses Molly Bloom Foto: Sueli Almeida (Sueluz Fotografia)

Paulo Gircys em Ulisses Molly Bloom Foto: Sueli Almeida (Sueluz Fotografia)

Ator, diretor e pesquisador de teatro, Paulo Gircys sempre teve uma relação aberta com o teatro russo. Estudou Stanislávski e Meierhold, dirigiu “O pedido de casamento”, de Tchekhov, e conduziu pesquisas na Lituânia e na Rússia. A viagem, diz ele, serviu para ver de perto tudo o que estudou e praticar a melhor forma de contato com o teatro: ver ao vivo.

Gircys contou um pouco dessa experiência à Gazeta Russa:

Gazeta Russa: De onde veio sua relação com o teatro russo?

Paulo Gircys: Sou graduado em Pedagogia do Teatro pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, onde realizei pesquisas sobre a relação entre direção teatral e a pedagogia no teatro russo e lituano. Com bolsa da Fapesp,  realizei uma pesquisa intitulada “Eimuntas Nekrosius: encenação e pedagogia”.

GR: Os brasileiros em geral mostram interesse no teatro clássico russo?

PG: A cultura teatral brasileira é muito variada. Porém, devido a diversos impedimentos quanto às políticas públicas de investimento e trato ao material artístico em nossa sociedade, pouco do teatro russo alcança de fato o espectador brasileiro. No caso dos artistas teatrais brasileiros, podemos sim aumentar esse alcance, com a dramaturgia de Tchekhov ou Gógol, os trabalhos de Stanislavski, Meierhold e outros. Esses são diretores, atores, e estudantes de teatro conhecidos, cujo material pode ser encontrado com facilidade em língua portuguesa. Talvez a literatura tenha dados passos mais largos.

GR: Que diferenças essenciais você destacaria entre o teatro russo e o brasileiro?

Paulo: Eu diria que a diferença é "hemisferial", a mesma entre o calor e o frio. Que ninguém se engane, não são opostos absolutos, mas sim complementares. Digo do que vi em passagem por Moscou e São Petersburgo e do que posso ver aqui no Brasil.

Não me pareceu que na Rússia o teatro e a arte em geral são dúvidas, e sim certezas de que devem existir. Há investimento do Estado e manutenção de uma tradição sólida, uma herança artística que, a meu ver, traz o que há de mais sofisticado para a cena teatral russa, um palco que sabe ser usado - ainda que, e talvez pela força da tradição, muito do que é conservado parece nem sempre olhar com bons olhos algumas novidades estéticas e conceituais.

No caso do Brasil,  repito, são inúmeros os problemas de políticas públicas e investimento em cultura e arte. Talvez por isso tenham surgido não só tentativas de repensar o acesso e a fruição do espectador teatral brasileiro, como projetos de formação de público, como novos formatos estéticos e poéticos: teatro de rua, teatro em espaços não convencionais, teatro performativo, teatro de pesquisa etc.

GR: O que mais te impressiona no teatro russo?

PG: É difícil dizer. Assim como em qualquer lugar, há peças que impressionam e outras que não. Talvez ver teatros muito cheios, dos mais variados, não importando se de diretores muito antigos ou mais recentes, nem se a peça tinha 3, 4, 5 ou até 6 horas. Ver uma cultura funcionando a todo vapor impressiona. E, claro, ver o trabalho de diretores que não conhecia e que vêm trilhando um recente, mas forte trabalho teatral. Gostaria muito de conhecer melhor Krimov, Butusov etc.

GR:  As técnicas usadas na educação dos atores são as mesmas?

PG: Posso afirmar que não são as mesmas técnicas exatamente. O trabalho de Stanislávski e Meierhold, principalmente, reverberaram no Brasil, assim como no mundo todo - ainda que muitas vezes distorcidos por traduções e outras releituras.

Hoje possuímos no Brasil escolas de teatro muito diferentes, tanto em escolas de especialização quanto em universidades. Claro que, ao falarmos de um teatro estritamente dramático, o nome desses russos são referências fortes aqui e são lidos constantemente. Mas é impossível ser idêntico. É outra cultura, outro bombardeio de influências.

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